SERGIO SALVIA COELHO
CRÍTICO DA FOLHA

"Os que Têm a Hora Marcada", de Elias Canetti, químico e prêmio Nobel de literatura, soa como um problema lógico que parte de uma premissa e se desdobra em aplicações.
Dado um universo em que todos sabem a idade em que vão morrer, idade ostentada no próprio nome da pessoa e justificada por informações hermeticamente escondidas em uma cápsula que se leva pendurada ao pescoço, imagine o diálogo entre a jovem mãe Trinta e Dois e seu filho Setenta. Que educação dar a Dez?
Estabelecida a plausibilidade desse universo, surge Cinquenta, o inconformado, que descobre que todas as cápsulas estão vazias, desencadeando a revolução.
A partir de sua experiência de judeu em época de Holocausto, Canetti denuncia as classificações arbitrárias que podem florescer em qualquer sociedade, mas vai além: depois que o novo triunfa, é preciso responsabilizar-se por ele.
É empolgante que, na atual época de abertura de cápsulas, se encarregue de tocar nesta ferida uma companhia tão jovem quanto a do Teatro Febril.
Composta de oito atrizes e quatro atores com menos de 25 anos, a cia. formada no teatro-escola Célia Helena afinou uma montagem curricular ao longo do ano passado, e agora surge mais madura.
Ainda há falhas a corrigir, visíveis sobretudo em um texto tão difícil. No entanto, a decisão do diretor Nelson Baskerville de deixar a responsabilidade pelo espetáculo na interpretação é bastante compensatória.
É empolgante, sobretudo, ver como cada ator não perde sua personagem mesmo quando faz figuração para os parceiros. Pela clareza de proposta e autonomia, a Cia. do Teatro Febril é uma companhia de protagonistas, que merece ser acompanhada.

Os que Têm a Hora Marcada    
Texto: Elias Canetti
Direção: Nelson Baskerville
Com: Cia. do Teatro Febril
Onde: teatro Sérgio Cardoso (r. Rui Barbosa, 153, Bela Vista, região central, tel. 0/xx/11/288-0136). 144 lugares
Quando: qua. e qui., às 21h
Quanto: R$ 10