São Paulo, sábado, 22 de janeiro de 2005

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Casa gaúcha Ame o Poema estréia com 14 títulos, editados por Ricardo Silvestrin e Alexandre Brito, buscando espaço em turnês e tentando escapar do conservadorismo

Poesia toda prosa

Jefferson Fernandes/Folha Imagem
Da esq. à dir., os poetas Celso Gutfreid, Ricardo Silvestrin, Alexandre Brito, Paulo Seben e Silvestrin Roberto, da editora Ame o Poema


MÁRVIO DOS ANJOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Depois da ascensão dos astros do pop-rock como os porta-vozes da palavra poética, chegou a hora de os poetas deixarem suas torres de marfim e mostrarem a cara, ou até mesmo sair em turnê. Essa é a aposta da editora gaúcha Ame o Poema, que estréia com 14 títulos.
Desses, dez livros são de autores que atuam na cena gaúcha há tempos, mas que acabam sendo pouco divulgados nas outras regiões -talvez o mais conhecido do grande público seja o cantor Frank Jorge, mas por seu rock (Graforréia Xilarmônica, Cascavellettes e trabalho solo).
Eles vêm mesclados a outros mais conhecidos, como Glauco Mattoso e Alice Ruiz, e o piauiense Fred Maia, letrista de MPB. Debutantes mesmo só a curitibana Estrela Ruiz Leminski (filha de Alice com, sim, ele mesmo) e o gaúcho Marcelo Pires. Em cada capa, uma foto do autor.
"Pusemos os poetas nas capas dos livros, como nas capas de CDs em que os artistas aparecem", diz o editor Ricardo Silvestrin, 41, que toca a empreitada com Alexandre Brito, 45, ambos poetas.
"Entendo perfeitamente porque as editoras não investem. Mas existe um mercado de poesia que dá resultados, se bem explorado. Poesia não se vende, se desvenda", acredita Brito, que trouxe à parceria suas vivências tanto na poesia quanto como produtor cultural. Alavancando patrocinadores, conseguiram lançar a fornada de uma só vez. Para fazer a ousadia chegar ao público, a dupla aposta numa turnê para atingir resultados eficientes.
"Poesia tem uma questão de ter os lançamentos para atrair os interessados. No nosso caso, as pessoas normalmente vão por causa de um autor, mas ninguém sai com um livro só", diz Silvestrin, lembrando que no lançamento em São Paulo, em 2004, venderam mais de cem livros. "Imagina quanto tempo levaria se só deixássemos nas livrarias?", diz.
O sistema foge ao padrão mais comum, de antologias ou publicações periódicas. Mas vale a pena lançar 14 livros de uma vez? "Toda editora se fortalece por meio de um catálogo, e o fato de ter 14 títulos soma os públicos desses autores, mistura tudo", diz Silvestrin.
Só que não é fácil reunir o grupo todo. Na estréia da editora, em novembro, durante a Feira do Livro de Porto Alegre, estavam ausentes Glauco e Ricardo Portugal. A estratégia, diz Brito, é levar pelo menos dois poetas aos eventos.
"Temos uma programação pelo interior do Estado e em Santa Catarina e também queremos entrar no circuito universitário, onde há um interesse na poesia", declara Brito, para quem o boca a boca e a internet também serão ferramentas importantes.

Critérios
Apesar de buscar um impacto no mercado, a seleção escalada pela editora -que pôs números nas costas de cada autor, como um time- atende, segundo seus responsáveis, a critérios subjetivos, como convém à arte.
"São pessoas que dominam a linguagem poética dentro de uma história, que têm um estilo maduro e dialogam com alguma vertente. São lúcidos objetos de linguagem", afirma Silvestrin, citando João Cabral de Melo Neto.
Alguns já eram conhecidos de Silvestrin desde a época da universidade, como João Angelo Salvadori, Celso Gutfreind e Ricardo Portugal. Outros, como Ronald Augusto, vieram de leituras e de eventos de poesia.
"A Alice Ruiz ficou tão empolgada com a idéia de uma editora só de poemas que eu falei: "Puxa, então dá um livro para a gente. Ela se empolgou bastante com a minha poesia quando nos conhecemos", conta Silvestrin. O [Paulo Seben] já tinha um livro pronto [de poemas satíricos e pornográficos], mas não queria lançar. "Vou arrumar um problema com a minha mulher", ele disse."
Não há, para os editores, nenhuma obrigação estética dentro da seleção da editora. Brito afirma que a única preocupação é fugir de um conservadorismo.
"Não queremos representar uma corrente, uma moda. Queremos poesia boa e uma reflexão sobre o momento atual dela no Brasil", afirma Brito. "Mas, se for o caso, nada nos impede de ter um livro com o Ferreira Gullar com a nossa camiseta", diz Silvestrin.
Segundo os editores, o surgimento da Ame o Poema já atraiu o interesse de vários poetas, o que já faz a editora prometer em novos lançamentos para breve.
"Tem a Rosa Clement e o Aníbal Beça, de Manaus, que têm textos ótimos, e outros autores que nós recebemos por indicação de amigos", diz Silvestrin.

AME O POEMA. 20 títulos de poesia, editados por Ricardo Silvestrin e Alexandre Bito. Quanto: R$ 20 (cada livro). Onde achar: www.paubrasil.com.br/ameopoema.

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