São Paulo, domingo, 22 de fevereiro de 2009

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Oscar da recessão

Com menos patrocinadores e mais discrição, Los Angeles promove hoje a festa do cinema em meio à crise econômica

SÉRGIO DÁVILA
ENVIADO ESPECIAL A LOS ANGELES

Em 1933, no auge da Grande Depressão norte-americana, os membros da Academia de Ciências e Artes Cinematográficas dos EUA se reuniram para um jantar frugal no Ambassador Hotel de Los Angeles, hoje demolido, mas que entraria para a história 35 anos depois ao ser palco do assassinato do senador Bobby Kennedy.
Era a sexta cerimônia do Oscar. Com apresentação do ator-caubói Will Rogers, a noite premiou entre outros o diretor Frank Lloyd, seu filme "Cavalgada" e os atores Charles Laughton ("Os Amores de Henrique 8º") e Katharine Hepburn ("Manhã de Glória").
O mundo ia mal, mas os negócios em Hollywood iam muito bem. A cada semana, pagando 15 centavos de dólar pelo ingresso, ou US$ 2,50 em dinheiro de hoje, entre 60 e 70 milhões de pessoas lotavam os cinemas no país inteiro. Era o equivalente à nada desprezível metade da população dos EUA.
Hoje, Los Angeles realiza o primeiro Oscar da pior recessão a atingir o país e o mundo desde aquela década. Diferentemente de nos anos 30, no entanto, o país vai mal -e Hollywood também. A começar pela exibição da cerimônia na TV. Espera-se que a performance de 2008, a menos vista da história recente, se repita.
Cerca de 32 milhões de telespectadores viram a transmissão nos EUA então, ante 40 milhões em 2007 e números progressivamente maiores nos anos anteriores. A baixa expectativa para hoje e a crise levaram a ABC, que detém os direitos dessa noite no país, a baixar 18% o preço do anúncio de 30 segundos, para US$ 1,4 milhão.
Ainda assim, a GM cancelou sua campanha pela primeira vez desde 1992 -a montadora é o cerne da crise por que passa o setor nos EUA, atualmente negociando um segundo pacote de ajuda federal-, assim como a gigante de cosméticos L'Oreal, que anunciou sua saída uma semana antes do evento.
Com isso, a emissora tomou a decisão inédita de liberar a publicidade de estúdios de cinema na transmissão, uma proibição não-escrita que ajudava a manter a credibilidade do prêmio. De qualquer maneira, só serão permitidos filmes que ainda não estrearam, e não concorrentes da noite.

Sem ostentação
Fora do Kodak Theatre, palco do Oscar, a situação não é melhor. A tradicional festa Night Before, prevista para acontecer ontem no Beverly Hills Hotel, cortou as chamadas "goodie bags", sacolas de patrocinadores distribuídas aos convidados com presentes caros como celulares de última geração ou noites em hotel cinco estrelas.
"Foram os patrocinadores que sugeriram que achássemos um jeito de fazer o mesmo tipo de evento sem tanta ostentação", disse Ken Scherer, da organização da festa. O tom se repete por toda a cidade, que viu diminuir o número de comemorações pré e pós-Oscar.
A tensão chega mesmo ao tapete vermelho, onde a ordem é paradoxal: ostentar, sim, mas com discrição. "Antes, era chique falar: "Estou usando US$ 16 milhões de jóias'", diz o assessor Howard Bragman, especializad o em aconselhamento para celebridades em crise. "Agora, isso é de mau gosto."
Nas bilheterias, o problema é notado no enfraquecimento do chamado "efeito Oscar", o salto que os filmes concorrentes normalmente recebem após o anúncio de que foram indicados. Em vez de ver o número de salas aumentar depois da indicação, longas como "Milk -A Voz da Igualdade", "O Leitor" e "Frost/Nixon", três dos cinco da categoria principal, passaram para menos telas.
Mas um indicativo do sinal dos tempos talvez tenha sido uma reunião recente feita pela Motion Picture Association of America, a Fiesp do setor cinematográfico, em Washington. Nela, altos executivos de estúdios esperavam com ansiedade por um anúncio, que seria feito nas horas seguintes.
Ele veio, e o clima foi de decepção. Não se tratava de nenhum das dezenas de prêmios que antecedem o Oscar e vão esquentando a competição. A emenda de US$ 246 milhões em cortes de impostos para as produções de cinema havia sido derrubada do pacote de estímulo econômico do presidente Barack Obama. Hoje, isso também é Hollywood.


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