|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
FESTIVAL
Evento reúne música, artes plásticas, literatura e cinema para tentar unir países de língua portuguesa
Brasil ergue "Pontes Lusófonas 2000"
RUI NOGUEIRA
Secretário de Redação da Sucursal de Brasília
Desde fevereiro de 98 à frente
do Instituto Camões (IC), o historiador Jorge Couto tenta levar o
maior número possível de estrangeiros, brasileiros em particular, a
contatar algum tipo de manifestação cultural lusa. O IC é o braço
do Ministério dos Negócios Estrangeiros para promover a cultura portuguesa no exterior.
Couto, 49, é o autor do best seller "A Construção do Brasil". Em
entrevista à Folha, o historiador
anunciou que as "Pontes Lusófonas 2000" serão realizadas, em
outubro, em São Paulo, no Rio e
em Brasília.
As "Pontes" são um grande festival de música, artes plásticas, literatura e cinema para tentar unir
oito países de língua portuguesa
(Brasil, Portugal, Angola, Moçambique, Cabo Verde, Guiné-Bissau, SãoTomé e Príncipe e Timor Leste).
Folha - Qual é a política do IC
para o Brasil e como vocês
atuam?
Jorge Couto - Atuamos no Brasil de três formas. Com um programa de estreitamento das relações com as universidades brasileiras. Criamos a cátedra Jaime
Cortesão na USP (história), a cátedra padre Antonio Vieira na
PUC do Rio (literatura) e celebramos acordos com a PUC de Minas e a UnB (Brasília).
Criamos instrumentos que favorecem a formação de quadros
nas universidades brasileiras especializados em estudos portugueses, com programas de bolsas,
seminários, exposições e outros
eventos culturais.
Em segundo lugar, participamos regularmente de eventos como as bienais e feiras de livros de
São Paulo, Rio e Porto Alegre.
Quanto às estruturas fixas, temos
uma sede bem equipada do IC em
Brasília e estamos a criar um pólo
do instituto em São Paulo. Os salões do palácio de São Clemente,
no Rio, também se transformaram em pólo cultural, para atividades de música, literatura e outras manifestações artísticas.
Folha - Por que a literatura
concentra a maioria das manifestações culturais portuguesas
de alcance internacional?
Couto - Não é só a literatura. Há
realmente um surto de grandes
escritores que estão a se firmar
pelo mundo afora. Mas a música,
o cinema, a arquitetura e as artes
plásticas também experimentam
uma expansão internacional. Sublinharia ainda a grande importância do cinema português. Começa a se verificar uma presença
constante de cineastas portugueses no festival de Gramado.
Folha - Os franceses têm a
Aliança Francesa. Os ingleses, o
British Council. Os norte-americanos, a Thomas Jefferson. Em
que momento Portugal sentiu
necessidade de fazer a sua investida internacional?
Couto - Em meados da década
de 80, Portugal começou a definir
uma política de internacionalização da sua cultura, e, em 92, criou-se o Instituto Camões. O IC nasceu da fusão de um instituto que
funcionava no Ministério da Educação com a direção dos serviços
de relações culturais externas do
Ministério dos Negócios Estrangeiros (relações exteriores).
O IC tem vindo a aperfeiçoar-se,
a contratar profissionais qualificados e não age isoladamente.
Atua no exterior e, sempre que
possível, em colaboração com o
Icep, universidades, fundações.
Promove um diálogo entre criadores e agentes culturais.
Folha - O Brasil parece caminhar para ser uma reprodução
da matriz cultural anglo-saxônica. Há público brasileiro interessado na cultura portuguesa? O
IC não pode estar a jogar dinheiro fora ao investir no Brasil?
Couto - Não. São coisas diferentes. Uma coisa é a globalização, os
meios de comunicação, a música
e o cinema anglo-saxônicos que
têm uma predominância mundial. Mas isso não esbate o ponto
fundamental, que é o da pluralidade, do multiculturalismo. Todas as culturas têm o seu lugar e,
tal como a biodiversidade, essas
culturas são uma riqueza a preservar. Com as fronteiras econômicas em diluição e a formação
de grandes blocos (UE, Nafta,
Mercosul e outros), a cultura é o
cimento das identidades.
Folha - Qual é a maior demanda brasileira da cultura portuguesa?
Couto - É uma demanda diversificada, mas a literatura continua
a suscitar o maior interesse. O caso do escritor José Saramago é a
consagração de um movimento
ascendente que a literatura conhecia desde a década de 80.
Folha - E qual é a grande lacuna da cultura brasileira em Portugal?
Couto - Faz falta uma instituição brasileira similar à portuguesa (IC), para que promovesse regularmente a ida de escritores, cineastas e artistas plásticos a Portugal. Existe a Casa do Brasil, uma
instituição privada, mas que vive
da cotização dos sócios.
Folha - Desde o início das comemorações dos 500 anos da
chegada à Índia (Vasco da Gama, 1498), os portugueses patrocinam estudos aprofundados
sobre os descobrimentos. Esses
estudos ajudaram a criar uma
visão nova do papel dos colonizadores?
Couto - A história dos descobrimentos era tradicionalmente vista só do ponto de vista de Portugal. A grande aquisição com os
novos estudos é que nós passamos a estudar a chegada dos portugueses ao Oriente.
Deveríamos adotar sempre o
mesmo critério em relação ao
Brasil. Não estudar apenas a chegada de Cabral, mas a gente que já
estava aqui. Esse foi o enfoque
que eu dei no meu livro ("A Construção do Brasil"), ao dedicar
mais de cem páginas do segundo
capítulo ao fato de que Cabral e a
sua tripulação encontraram aqui
a vida dos tupiniquins, suas crenças, sua cultura material, toda
uma organização política e social.
Folha - Por que o livro português no Brasil é absurdamente
caro e não se faz um acordo de
redução de impostos entre os
dois países?
Couto - O ministro Rafael Greca
já anunciou que serão criadas facilidades nesse sentido. Mas o
ideal seria que as editoras lançassem os livros em simultâneo.
Com a tecnologia da comunicação e a edição eletrônica, não há
por que não fazer isso. Os brasileiros Paulo Coelho e Nélida Piñon
estão a ser editados em Portugal, e
Augusto Abelaira e Helder Macedo, por exemplo, a serem editados e mais conhecidos no Brasil.
Folha - Qual é a importância
histórica da venda dos bens da
Companhia de Jesus no Nordeste, a ponto de ser o tema do seu
próximo livro?
Couto - Foi a primeira vez na
Idade Moderna que, na Europa,
um país nacionalizou os bens de
uma congregação religiosa e os
vendeu por meio de um sistema
de hasta pública.
Esse sistema foi depois adotado
na Espanha e na França e foi um
incentivo aos movimentos liberais.
Muitos proprietários aproveitaram para arredondar as suas terras e muitos ficaram ricos ao
comprar os bens dos jesuítas que
se concentravam em patrimônio
urbano -era muito grande: casas, sobrados, trapiches, armazéns e uns poucos engenhos.
Texto Anterior: Show: Elba Ramalho vai ao shopping Próximo Texto: Braço da entidade nasce dia 28 Índice
|