São Paulo, domingo, 22 de março de 2009

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Fumo está em 60% dos filmes nos EUA

Número é considerado ainda alto por estudo que aponta o cinema como responsável por 52% da iniciação ao cigarro entre os jovens

EDUARDO SIMÕES
DA REPORTAGEM LOCAL

Um estudo divulgado no mês passado nos Estados Unidos revelou que, apesar das campanhas antitabagistas terem ganhado fôlego nos últimos anos, o cinema hollywoodiano pode ainda estar bastante impregnado pela fumaça dos cigarros.
De acordo com a pesquisa "Smoking Presentation Trends in U.S. Movies 1991-2008" (tendências na apresentação do fumo em filmes dos EUA de 1991 a 2008), o cigarro ainda aparece em cerca de 60% das produções, independentemente da classificação indicativa. O número, referente ao ano de 2008, é considerado alto pelos pesquisadores, especialmente levando em cionta o público adolescente. Eles estimam que 52% da iniciação ao fumo entre jovens se deva às imagens de cigarro na telona.
Feito pela Universidade da Califórnia, em San Francisco, o estudo analisou 1.769 títulos produzidos em 18 anos e sugere como "solução" adotar a classificação indicativa "R", segundo a qual filmes com cenas de cigarro só poderiam ser vistos por menores de 18 anos se acompanhados de seus pais ou de responsável.
Em entrevista por e-mail à Folha, Jonathan Polansky, um dos três pesquisadores que assinam o estudo, disse que na última década houve uma redução geral do número de filmes que veiculam fumo. Isso porque os estúdios vêm produzindo mais filmes "para a família", isto é, voltados para o público infantil e, por isso mesmo, 100% sem cigarro.
"A preocupação é que pouco ou nada mudou em filmes "PG13" [não recomendado para menores de 13], a maior categoria e o tipo de filme que adolescentes mais vêem", diz.
Polansky explica que a estimativa de que 52% da iniciação ao fumo, entre jovens, se deve às imagens de cigarro na telona, é fruto de uma pesquisa da Dartmouth Medical School, de New Hampshire. Reconhecido pelo U.S. National Cancer Institute (instituto nacional do câncer dos EUA) em um documento apresentado em 2008, o levantamento foi acrescentado às conclusões de Polansky:
"Os adolescentes americanos vêem mais filmes do que qualquer outro grupo etário. E a influência da imagem do fumo na tela é muito poderosa", afirma Polansky. "A combinação da exposição em larga escala com uma influência poderosa explica por que boa parte da iniciação é atribuída aos filmes."
O psiquiatra Jairo Bouer, colunista da Folha, concorda que as imagens veiculadas no cinema, na TV e na propaganda são incentivadoras de comportamentos entre os jovens. Para ele, no entanto, a restrição a imagens de cigarro no cinema, ou a mudança na classificação indicativa, somente em teoria diminuiriam a "cópia":
"Poderia ser um fator a menos, mas acho que o cara não vai deixar de fumar porque não viu no cinema. Há outros estímulos, como a família, a escola e os amigos", diz Bouer.

Classificação indicativa
Nos EUA, incluir ou não o fumo nos critérios de classificação indicativa seria uma decisão da Motion Picture Association of America, que representa os principais estúdios. Em 2007, a MPAA chegou sinalizar que o faria, ao associar-se a uma "coalizão" de empresas de entretenimento contrárias à imagem de cigarros nas telas.
"A informação que temos é que a MPAA iria anunciar a classificação "R" para filmes com cigarro naquele ano, mas um estúdio grande acabou esmagando a nova política no último minuto", diz Polansky, sem revelar qual estúdio teria feito o lobby contrário.
Até o fechamento desta edição, a reportagem da Folha não havia recebido comentário solicitado aos representantes da MPAA no Brasil.

Liberdade de expressão
A defesa da inclusão das imagens de cigarro entre os critérios de classificação coloca outra questão: a dos limites da liberdade de expressão de roteiristas, diretores etc.
Polansky afirma que atualmente produtores e diretores deliberadamente "calibram" o conteúdo dos filmes de olho no mercado. Aceitar uma classificação mais restrita ou tirar cenas com cigarro faz parte do que ele chama de "mecanismo voluntário de mercado". "E é uma questão de saúde pública. Não de gosto ou moral".
Em outubro do ano passado, o veterano crítico de cinema Roger Ebert, do "Chicago Sun-Times", disse em seu blog que, apesar de "odiar cigarros", defende as cenas com fumo no cinema em pelo menos dois casos: como traço característico do personagem ou marca da época em que a ação se passa.
Ebert também ironizou a proposta de restrição, ao lembrar as cenas com fumo que foram cortadas de "Casino Royale", reproduzindo uma entrevista em que o 007 Daniel Craig lamentava ter podido "estourar os miolos de alguém", mas não acender um bom charuto.


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