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Presidente da Bienal contrata empresas da mulher e do genro
Parentes cuidam de seguro e paisagismo; empresa de "factoring" de Pires da Costa comprava duplicatas que a fundação tinha a receber
MARIO CESAR CARVALHO
FABIO CYPRIANO
DA REPORTAGEM LOCAL
O presidente da Fundação
Bienal, o empresário Manoel
Pires da Costa, tem predileção
por fazer negócios em família.
A fundação contratou a corretora de seu genro para tratar do
seguro da 27ª Bienal de São
Paulo, em 2006, e uma empresa de sua mulher cuida do paisagismo do pavilhão de exposições desde 2002.
Uma empresa de "factoring"
do próprio Pires da Costa, a
Santa Rita, comprava duplicatas que a Bienal tinha para receber das firmas que alugavam
espaços no pavilhão de exposições para feiras ou eventos.
Em 2004, o restaurante da
Bienal foi entregue a um amigo
do genro do presidente da fundação. As empresas de Pires da
Costa, de sua mulher e do genro
ficam no mesmo endereço.
"Factoring" é o tipo de empresa que compra duplicatas
ou cheques pré-datados. Num
exemplo hipotético, imagine
que a Bienal tenha uma duplicata de R$ 10 para descontar
em 90 dias. A "factoring" paga
hoje R$ 9 por essa duplica-
ta, antecipando recursos à
fundação.
Normalmente, recorrem a
"factoring" apenas empresas
que não têm acesso a crédito
bancário. A razão é a taxa de
juros das "factoring" -chega a
ser o dobro das praticadas
por bancos.
Bienal quebrada
No total, a Santa Rita pagou
R$ 2,4 milhões à Bienal, segundo Pires da Costa. Ele não soube dizer qual era a diferença entre o valor que a Bienal teria a
receber e o que foi pago por
sua empresa.
Segundo ele, o cálculo é complexo porque as duplicatas tinham prazos muito variados
-de 115 a 270 dias.
Pires da Costa disse que a sua
própria empresa fez o negócio
com a Bienal porque a instituição estava quebrada, com uma
dívida de R$ 4,5 milhões em
2002, e nenhum banco ou empresa de "factoring" queria fazer negócios com a fundação.
Conselheiros confirmam que a
Bienal estava quebrada.
"Perdi dinheiro com a Bienal.
Se tivesse feito outro investimento, teria ganho mais", disse. Em 2002, ele fez um empréstimo de R$ 1 milhão à Bienal, que foi quitado em 2004.
Segundo o estatuto da Bienal,
a fundação não pode fazer negócios com presidente e conselheiros. A razão do veto é mais
ou menos óbvia: ao fazer negócios consigo próprio, o presidente da fundação poderia suscitar suspeitas sobre a licitude
dos preços. A contratação de
empresa de parente viola, em
tese, o princípio da impessoalidade que deve reger fundações
que recebem recursos públicos.
A Bienal, que realiza a principal mostra de arte do país, é
uma fundação de direito privado que recebe recursos públicos dos governos federal, estadual e municipal. A última
mostra custou R$ 20 milhões.
Pires da Costa diz que violou
o estatuto da Bienal e o princípio da impessoalidade, mas não
deu prejuízo à fundação.
Quem contratou a KEF, corretora de seguros do genro, segundo o presidente da Bienal,
foi Jacopo Crivelli. Produtor da
mostra promovido a curador,
Crivelli diz que a corretora do
genro do presidente da Bienal
foi escolhida porque é especializada em arte.
Ele, porém, não conseguiu citar nenhuma mostra de arte em
que a KEF tenha trabalhado.
Falou da feira de Hannover
(2000), evento que mescla tecnologia, mercado e cultura, e da
BM&F (Bolsa de Mercadorias
& Futuros), da qual Pires da
Costa foi presidente.
Paisagismo
A mulher do presidente da
Bienal, Ana Lucia Barreira
Margutti, recebeu R$ 57 mil
para cuidar do paisagismo do
pavilhão desde 2002. Foi o presidente anterior, o arquiteto
Carlos Bratke, que contratou
Margutti, segundo Pires da
Costa.
Uma empresa do presidente
da Bienal, a TPT Comunicações, recebeu cerca de R$ 2 milhões da Bienal para fazer as
30 edições da revista "Bien'art". A Bienal pagou mais
R$ 470 mil pelo projeto da revista. O Ministério Público
concluiu que os valores são
compatíveis com os praticados
pelo mercado.
Apesar do OK dos promotores, nova auditoria vai analisar
as contas de Pires da Costa. A
decisão partiu de um grupo de
ex-presidentes da Bienal. O
grupo foi criado no dia da reeleição de Pires da Costa (19 de
abril) para averiguar as razões
que levaram o conselho fiscal a
rejeitar as contas de 2006 por
"julgá-las comprometidas".
A "comissão de notáveis", como a apelidou o presidente do
conselho administrativo da
Bienal, Miguel Pereira, é formada por Alex Periscinoto,
Carlos Bratke e Julio Landman,
que preside o grupo.
A comissão decidiu contratar
uma auditoria. Ela tem até 19
de junho para chegar a um parecer, quando termina o prazo
da posse do presidente reeleito.
"O conselho reelegeu o presidente com um voto de confiança, mas sob a condição da existência da comissão de ex-presidentes para entender e resolver
o problema", diz Pereira. Ou seja, Pires da Costa ganhou a eleição, mas pode não tomar posse.
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