São Paulo, quinta-feira, 22 de maio de 2008

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crítica

Bressane faz paródia de Hollywood

CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA

Em uma das primeiras imagens de "Cleópatra", Julio Bressane compõe um plano que se transforma e inaugura o sentido de sua abordagem aparentemente anacrônica da personagem: em close, vê-se uma vagina depilada e sobre a qual, em tinta negra, se destaca a forma de um triângulo. Ao girar, o órgão sexual converte-se na forma de uma pirâmide.
Assim, o filme concentra a força do cinema de Bressane, ao fazer aproximar e coincidir, sem nem mesmo precisar justapor duas imagens, o tema da tirania, que se impõe em duas formas: o desejo e o poder político.
A utopia de Bressane é fazer os dois exercícios de domínio se equilibrarem numa justa imagem, mediada pela sedução. E é a isto que ele se entrega ao se concentrar na triangulação que seu relato constrói a partir das personagens da rainha egípcia e seus pares romanos, Julio César e Marco Antônio.
A escolha da grande personagem integra um percurso que Bressane vem fazendo pelo menos desde "Tabu" (1982) e, mais recentemente, com as figuras do padre Antônio Vieira, São Jerônimo e Nietzsche, que consiste em se apropriar dos clichês biográficos e inseri-los numa outra ordem, tanto mais infiel à "verdade" histórica quanto mais estimulante a seu "cinema de invenção".
No plano erudito, do qual o espectador só consegue se aproximar pelo ouvido sem desvendar os segredos, a Cleópatra bressaniana é uma experimentação do mito pelos textos, na qual as falas e as dicções metamorfoseiam o Egito em um espaço do império lusitano.
No plano popular, de mais imediata decodificação, "Cleópatra" brinca com os clichês hollywoodianos. Ao usar o Rio como cenário egípcio, parodia a versão faraônica com Elizabeth Taylor que levou o estúdio à falência. Ao escalar os globais Alessandra Negrini, Miguel Falabella e Bruno Garcia para os papéis centrais ironiza esta outra Holywood, bem nossa e bem próxima.


CLEÓPATRA
Produção:
Brasil, 2007
Direção: Julio Bressane
Com: Alessandra Negrini, Miguel Falabella, Bruno Garcia
Onde: no Cine Bombril e Unibanco Arteplex; classificação: 18 anos
Avaliação: bom


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