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Crítica/"Contos Reunidos"
Livro traz Marques Rebelo refinado e impressionista
BIA ABRAMO
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Marques Rebelo (1907-1973) é uma espécie
de surpresa.
Não deveria, uma vez que era
um contista refinado, escritor
admirado por escritores e, de
quebra, autor de um dos poucos romances que se debruça
sobre o sistema de celebridades
da era do rádio, "A Estrela Sobe" (de 1939).
Mas, como outros escritores
da primeira metade do século
20 que se dedicaram aos temas
urbanos, foi deixado de lado pela força coletiva do romance regionalista e, talvez, esmagado
pelas unanimidades em torno
de Clarice Lispector ou de Guimarães Rosa.
Nos "Contos Reunidos", a
José Olympio reedita seus três
volumes dedicados à narrativa
curta: "Oscarina" (1933), "Três
caminhos" (1933) e "Stela Me
Abriu a Porta" (1942).
A intensa observação da vida
do Rio de Janeiro que emerge a
cada período dos contos de
Marques Rebelo impressiona:
aqui e ali surge uma cidade que
transita de maneira rápida para
a modernidade, ao mesmo tempo inventando uma vida semi-rural ou de cidade pequena nos
subúrbios.
Quase cronista
Por vezes, é essa observação,
expressa com o colorido de um
pintor impressionista, que domina e, provavelmente, foi o
que deixou a impressão de que
Marques Rebelo (pseudônimo
de Edi Dias da Cruz) estaria na
categoria dos cronistas.
A voz lírica de contos protagonizados por crianças ou por
personagens que encarnam
uma certa ingenuidade do subúrbio também devem ter contribuído neste sentido.
O cenário suburbano ainda
não é o caldeirão de paixões extremadas e hipocrisia perversa
de Nelson Rodrigues, leitor de
Marques Rebelo, mas palco de
uma solidão e uma melancolia
já bem modernas, onde circulam pequenos funcionários,
donas de casa desencantadas e
moços acomodados.
Mas, embora o registro da
crônica esteja espalhado pelas
narrativas, Marques Rebelo,
certamente um leitor aplicado
de Machado de Assis, ambicionava a tensão dramática do
conto -e chega a ela pelos caminhos mais interessantes.
Mão de Machado
Ora, muito machadianamente, por viravoltas no caráter de
um personagem, como em "Caso de Mentira", ora por cortes
temporais abruptos, talvez
aprendidos no cinema, como
em "Stela me Abriu a Porta".
Os recursos conferem à narrativa uma dimensão mais ampla e ambiciosa do que a nada
simples, é verdade, habilidade
em oferecer a visão de um lugar
e uma época.
Mesmo que a mão de Machado às vezes pese demais, como
em "História de uma Abelha",
conto com o mesmo mote do
capítulo da borboleta de "Memórias Póstumas de Brás Cubas", não prejudica o conjunto.
E é sempre melhor emular
Machado do que, digamos, Rubem Fonseca, como faz uma
nova literatura brasileira média muito cheia de si.
CONTOS REUNIDOS
Autor: Marques Rebelo
Editora: José Olympio
Quanto: R$ 51 (480 págs.)
Avaliação: ótimo
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