|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
TEATRO - CRÍTICA
Filomena é um personagem em busca de autor
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local
Como Olímpia, a empregada enxerida de "Trair e Coçar", um tipo
marcante do palco na última década, esta Filomena é um achado teatral. Foi apresentada pela primeira
vez por Gorete Milagres cinco anos
atrás, no festival de teatro de Belo
Horizonte, ganhou fama e público
e acabou na televisão.
Não chega a ser uma criação original, tirada do nada. Como Olímpia, que a atriz Denise Fraga gostava de identificar com Arlequim, Filomena também lembra as máscaras da commedia dell'arte. Na verdade, vai além, aproximando-se
ainda mais do modelo.
É uma Colombina em quase tudo: está lá a comunicação direta e a
improvisação, que é praticamente
ininterrupta em "Filomena"; também está lá, é claro, o desenho original da empregada nada submissa, sempre a se intrometer e desafiar. Mas a Filomena de Gorete Milagres, que se orgulha de sua rigorosa formação de atriz, vai ao limite: parece ecoar aqui e ali os "lazzi", os números mais tradicionais
da commedia dell'arte.
A atriz e seu personagem têm
tanto de Arlequim e Colombina
quanto, por outro lado, do caipira
das comédias populares, um tipo
corriqueiro no palco brasileiro
desde o século 19. Desde França Jr.,
por exemplo, autor que parece inspirar a atriz em pelo menos um
quadro de "Filomena".
Gorete Milagres é de uma capacidade de improvisação aparentemente sem fim. Não conta piadas,
mas age e reage comicamente com
a platéia, sem texto definido. Tem
a trama básica, da empregada doméstica que se apresenta no teatro
pensando tratar-se de uma agência
de empregos. Mas é só.
O restante são cenas, quadros esboçados que se estendem ou não
conforme se encaminha a apresentação. A platéia do espetáculo visto
pelo crítico sabia bem das regras e
fazia seguidas intervenções, provocava, testava a atriz. Em momento nenhum Gorete Milagres titubeou nas improvisações.
Mas não se pode dizer que "Filomena" tenha só o que ganhar, com
a sua opção pela improvisação. Ao
terminar, a peça deixa um vazio,
uma frustração quanto aos seus
propósitos para além da diversão
mais direta, até infantilizada.
Os esforços para demonstrar seriedade de propósitos, como num
quadro sobre a Aids ou numa passagem sobre o voto de cabresto no
interior do Brasil, não ajudam a
definir a peça e chegam a soar paternalistas. "Filomena" ressente-se de um texto à altura do impacto
e do potencial teatral do personagem.
Por outro lado, para um espetáculo que se quer teatral, afinal de
contas, "Filomena" exigiria maior
atenção ao cenário e principalmente à iluminação: o público passa a maior parte do tempo sob dolorosa luz de serviço.
Avaliação:
Peça: Filomena
Texto e direção: Gorete Milagres
Quando: sex. e sáb., às 21h; dom., às 19h
Onde: teatro Imprensa (r. Jaceguai, 400, tel.
011/239-4203)
Quanto: R$ 15 (sex. e dom.) e R$ 20 (sáb.)
O colunista
José Simão está em férias.
Texto Anterior: Design: Brasileiro ganha prêmio de revista Próximo Texto: "É..." volta datada Índice
|