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Editoras "tradicionais" fortalecem a presença das histórias em quadrinhos nas livrarias
Estantes ilustradas
DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL
Antes confinadas às bancas de
revistas, as histórias em quadrinhos ganharam densidade, páginas e alguns reais a mais no preço
de capa e, de uns tempos para cá,
vêm ocupando espaço maior nas
estantes das livrarias.
O fenômeno mundial, que começou há décadas na Europa e só
recentemente desembarcou nos
Estados Unidos, onde as chamadas "graphic novels" vêm mostrando crescimento e compensando a queda de venda das revistas regulares de super-heróis,
consolidou-se no Brasil no ano
passado, com a adesão de editoras
de peso ao mercado.
Só em 2004, a Jorge Zahar Editor acrescentou três álbuns de
quadrinhos ao seu catálogo, até
então reconhecido pelas obras de
ciências sociais e clássicos da literatura: "Vincent & Van Gogh", de
Gradimir Smudja, e os dois volumes da trilogia "Em Busca do
Tempo Perdido", iniciada ainda
em 2003 e adaptada pelo francês
Stéphane Heuet a partir do clássico de Marcel Proust.
Para 2005, a editora guardou "O
Bordel das Musas", HQ em que o
mesmo Gradimir Smudja se debruça agora sobre a obra do pintor impressionista Toulouse-Lautrec, e também "O Pequeno Vampiro", do francês Joann Sfar, com
previsão de lançamento no Natal.
Um dos grandes nomes do quadrinho alternativo europeu contemporâneo da editora L'Association, Sfar terá ainda a sua série "O
Gato do Rabino" publicada por
aqui em 2006 pela Jorge Zahar.
"Começamos a publicar quadrinhos mais por paixão do que como negócio. Conheci o trabalho
do Stéphane e me apaixonei.
Achei que haveria mercado para
quem fizesse quadrinhos para um
público bacana, mais adulto",
conta Mariana Zahar, que, neste
ano, trouxe o autor da adaptação
de Proust à Bienal do Rio.
A aposta se provou viável: o primeiro volume de "Em Busca do
Tempo Perdido" teve a tiragem
inicial de 5.000 exemplares esgotada, e outros 3.000 foram rodados para uma segunda. "Foi impressionante o resultado dos leitores, de jovens até senhores de 80
anos, dizendo que foram ler o original de Proust só depois de ler os
quadrinhos", comemora Zahar.
É também "a paixão", segundo
Thyago Nogueira, que fez com
que a "tradicional" Companhia
das Letras engrossasse o seu catálogo de quadrinhos no ano passado, quando deu aos brasileiros os
fresquinhos "À Sombra das Duas
Torres", de Art Spiegelman (em
lançamento quase simultâneo aos
EUA), e também o pontapé inicial
na série "Persépolis", da badalada
quadrinista iraniana Marjane Satrapi. Neste mês, lança pelo selo
infanto-juvenil Cia. das Letras o
histórico "Maus", que rendeu a
Spiegelman um Prêmio Pulitzer
na década de 90, e planeja, para o
final do ano, os primeiros quatro
volumes da reedição integral da
série "Tintim", do belga Hergé.
"O Tintim nasceu de uma negociação que fizemos no ano passado na Feira de Frankfurt. Vamos
lançar todos, inclusive os inéditos
no Brasil ["Tintim no País dos Sovietes" e o póstumo "Alfa Art']",
adianta Nogueira.
Rogério de Campos, editor e
proprietário da Conrad, que, desde o seu surgimento, publica livros, "graphic novels" e revistas
de bancas, afirma que "estamos
entrando no melhor período dos
quadrinhos mundialmente".
"Você mede isso pela quantidade
de temas. Estamos publicando
um quadrinho da vida da [atriz,
fotógrafa, comunista, amante de
Diego Rivera...] Tina Modotti, em
que o [escritor Paco] Taibo 2º é
um personagem da HQ. Isso era
inimaginável em outros tempos.
"Persépolis" seria inimaginável."
Posicionamento
"Quando você entra nesse universo, tem de mudar o formato,
não dá para ser de banca. Estamos
falando de autores que exigem
papel e formatos diferentes e, para viabilizar isso, dependemos da
livraria", explica Campos, citando
20 mil unidades vendidas da edição luxuosa de "Sandman -°Noites sem Fim" e 15 mil das quadrinho-reportagens de Joe Sacco na
Palestina e na Bósnia.
Ainda neste mês, a Conrad
transporta das bancas para as estantes compilações em formato livro de dois de seus mangás mais
bem-sucedidos, a série "Vagabond", de Takehiko Inoue, e
"Dragon Ball", de Akira Toriyama, numa coleção em 38 volumes
retocada recentemente pelo quadrinista japonês. ""Dragon Ball"
vai concorrer com "Harry Potter".
E vencer. As vendas de "Dragon
Ball" já passaram de 1 bilhão no
mundo todo", afirma Campos.
Outro campeão de vendas está
fazendo reacender as prensas da
editora Record, que, até meados
dos 90, respondia por boa parte
dos álbuns de quadrinhos publicados no Brasil. É "Asterix", de
Albert Uderzo e René Goscinny,
que ganha versão "remasterizada", com retoque de cores e novo
letreiramento de Ota, editor da revista "Mad", das tiragens esgotadas da Record. Os gauleses mais
populares da França -onde as
HQs crescem a todo vapor e disputam os primeiros lugares com
os livros mais vendidos- devem
ganhar aventura inédita neste ano
pelas mãos de Uderzo. Se confirmada, a Record publica.
Na contramão
Enquanto muitos miram as livrarias, a Ediouro, que também
edita livros, mas é mais conhecida
por sua presença em bancas com
as palavras cruzadas da série Coquetel, deposita as esperanças de
sua recém-criada linha de quadrinhos no mercado de revistas.
"Acho que os quadrinhos nas
bancas se deram mal no Brasil por
miopia das editoras. No final dos
anos 90, passou-se a dizer que gibi
bom era gibi caro", questiona Rodrigo Fonseca, editor de HQs da
Ediouro. "O que estou tentando
fazer aqui é reposicionar o quadrinho europeu como uma opção
de qualidade que seja acessível e
não se limite ao álbum, consumido apenas por uma minoria."
Além dos recém-lançados "Star
Wars", "Aquablue" e "Nathan
Never", a editora pretende colocar nas bancas nas próximas semanas a minissérie francesa "Arthur" e o mangá holandês (!)
"Quark". Apesar da fidelidade às
bancas, Fonseca não descarta atacar as livrarias no futuro com álbuns de mestres europeus como
Lustal, Manara e Crepax.
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