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São Paulo, terça-feira, 22 de julho de 2003

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TEATRO

"A FLOR DO MEU BEM-QUERER"

Autor trata de corrupção e expõe artimanhas de caipira e de homens que estão no poder

Juca de Oliveira ri de "lideranças defeituosas"

VALMIR SANTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

"Caixa 2" (1997-2001) até citava políticos, mas eles não interagiam com a história do banqueiro sem escrúpulos que desviava dinheiro para a conta da amante. Agora, o comediógrafo Juca de Oliveira, empenhado nas variações da corrupção, bate direto à porta dos gabinetes de Brasília.
De Lula a ACM, passando por FHC e Heloísa Helena, ninguém escapa da sátira em "A Flor do Meu Bem-Querer", nova peça escrita e protagonizada por Oliveira, 68, de "Meno Male" (1987-91).
O espetáculo estréia amanhã no teatro Cultura Artística. A direção é de Naum Alves de Souza (do recente "Longa Jornada de um Dia Noite Adentro"). Renato Teixeira compõe a trilha, com temas do campo e jingles de políticos.
Em "A Flor do Meu Bem-Querer", Zé Otávio (Oliveira) é senador e candidato à Presidência da República. Impossibilitado de mexer no dinheiro depositado na Suíça, ele tenta vender sua fazenda, a Bem-Querer, para investir na campanha.
Os colonos resistem a deixar o local para o negócio. O chefe da família, Nho Roque (Genézio de Barros), que é caipira, mas não é bobo, usa como argumento a suspeição de que o senador, casado, é pai do bebê de Flor (Dominique Brand), a moça mais desejada daquelas plagas. Um escândalo derrubaria a candidatura, daí a confusão armada.
Acrescente-se um festival de testes de DNA, as artimanhas do assessor político do senador (Eduardo Galvão), da amante do senador (Cláudia Mauro), da mulher e da secretária do mesmo, ambas na voz em off de Marília Pêra, e do núcleo da fazenda (Barros, Brand e Jussara Freire) falando o "caipirês", cuja inspiração Oliveira foi buscar na região de Itapira (SP), onde tem fazenda, e no livro "Os Parceiros do Rio Bonito", de Antonio Candido.
"Os homens são defeituosos. Quando se escreve sobre uma liderança política ou financeira, a classe dominante, vai-se cair sempre no campo da comédia", diz o autor, que trocou a advocacia pelo teatro há mais de meio século.
"O Édipo [personagem do teatro grego que dorme com a mãe e mata o pai sem sabê-los como tais] escolheu investigar o crime até o fim, a despeito de descobrir que era o assassino. Mas os políticos, quando vão perseguir um crime contra a sociedade, param no meio do caminho, mandam engavetar porque serão atingidos. Passam para o campo da comédia. Se fossem até o fim, poderiam ser heróis trágicos."
Não se espere o engajamento à moda do teatro que Oliveira empreendeu no início da carreira (anos 50 e 60), tomado sobretudo pelas mãos de Augusto Boal, o criador do Teatro do Oprimido.
"Continuo sensível a essa horrível distribuição de renda no país, cada dia mais grave, mas não acredito no teatro de proselitismo. São questões que discutíamos 40 anos atrás, quando éramos jovens e achávamos que iríamos fazer a revolução por meio do teatro", diz o ex-militante comunista e sindical.
Em 1962, por exemplo, ele interpretou um coronel em "Mutirão em Novo Sol", de Boal, Nelson Xavier e Chico de Assis. A peça foi apresentada num congresso de camponeses em Belo Horizonte e numa conferência de lavradores em São Paulo, como atividade ligada ao Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC-UNE).
"Ao invés de ficar discutindo [os problemas], eu boto no papel, transformo em teatro."


A FLOR DO MEU BEM-QUERER. De: Juca de Oliveira: Direção: Naum Alves de Souza. Com: Juca de Oliveira, Juan Alba, Jussara Freire e outros. Onde: teatro Cultura Artística -°sala Esther Mesquita (r. Nestor Pestana, 195, tel. 3258-3616). Quando: estréia amanhã, às 21h; de qui. a sáb., às 21h; dom., às 18h. Quanto: de R$ 40 a R$ 90. Patrocinador: Microsiga.


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