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LIVROS
Crítica/coletânea
Contos recordam Rubião, o autor de "poucas palavras"
ADRIANO SCHWARTZ
ESPECIAL PARA A FOLHA
Os volumes "A Casa do
Girassol Vermelho" e
"O Pirotécnico Zacarias" trazem cada um 11 contos
de Murilo Rubião (1916-1991).
A eles, se juntará em breve um
terceiro livro, com outros 11
textos curtos. Estará, então,
mais uma vez nas livrarias reunida a parcela de sua produção
que o autor de poucas palavras
considerava valer a pena.
De certa forma, aliás, a idéia
de "poucas palavras" concentra
várias características essenciais dessa obra, não apenas pela razão óbvia de Rubião ter
exercido uma forma literária
que busca a condensação, mas
principalmente pelas regras
que estabeleceu para, como diria o heterônimo pessoano Ricardo Reis, nos legar a "memória de um jogo bem jogado".
As epígrafes, por exemplo,
sempre presentes, sempre extraídas da Bíblia: frases mínimas que não necessariamente
antecipam ou comentam a trama que vem na seqüência, mas
que, pela sua constância inalterável, criam um laço a ligar todos os contos, sugerindo uma
outra história, paralela, que
precisa ser narrada, ainda que
essa urgência não possa nunca
se efetivar.
Semelhança com Kafka
Como praticamente todos os
seus críticos mencionam, os
contos de Murilo Rubião lembram muito os de Kafka, seja
pelas constantes metamorfoses e transformações, das quais
a mais impressionante é a de
"Teleco, o Coelhinho", seja por
remeter aos absurdos da burocracia e de um mundo administrado, como em "O Edifício", "A
Fila" ou "O Ex-Mágico da Taberna Minhota", seja por, como
diz Sérgio Alcides no posfácio
de "A Casa do Girassol Vermelho", em ambos é possível perceber "vestígios remanescentes
de uma totalidade irremediavelmente perdida". Não há
muito a fazer, não há também
muito a dizer. Como afirma um
personagem de "A Armadilha",
"aqui ficaremos: um ano, dez,
cem ou mil anos".
O silêncio seria, é claro, uma
opção -foi a de alguns-, o exagero e o descontrole, uma segunda; uma e outra, sob certas
condições, igualmente válidas.
Murilo Rubião optou pela contenção. E resolveu trabalhá-la
no registro de um fantástico
desprovido de assombro, mas
que ao mesmo tempo em muitas ocasiões supõe ou indica
uma expectativa, um desejo,
que justifica e reconfigura o significado dessa "fala" restrita, às
vezes um simples lamento, como o do já citado ex-mágico:
"Por instantes, imagino como
seria maravilhoso arrancar do
corpo lenços vermelhos, azuis,
brancos, verdes. Encher a noite
com fogos de artifício. Erguer o
rosto para o céu e deixar que
pelos meus lábios saísse o arco-íris. Um arco-íris que cobrisse a
Terra de um extremo a outro".
ADRIANO SCHWARTZ é professor de literatura
na Escola de Artes, Ciências e Humanidades da
USP
O PIROTÉCNICO ZACARIAS
Autor: Murilo Rubião
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 29 (120 págs.)
A CASA DO GIRASSOL VERMELHO
Autor: Murilo Rubião
Editora: Companhia das Letras
Quanto: R$ 29
(104 págs.)
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