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MÚSICA ERUDITA
Composições de Gilberto Mendes, que criou o evento santista em 1962, estão na apresentação de hoje
São Paulo encerra Festival de Música Nova
JOÃO BATISTA NATALI
DA REPORTAGEM LOCAL
Com dois concertos em São
Paulo, na Faculdade de Artes Santa Marcelina -com o conjunto
russo Solistas de São Petersburgo,
hoje, e os belgas do Het Spectra
Ensemble, na quinta-, o Festival
Música Nova de Santos chega a
sua 36ª edição.
É uma longevidade rara na história das iniciativas culturais brasileiras. E ainda mais notável por
lidar com um repertório erudito
recentíssimo ou de algum momento do século 20, visto como
difícil ou dissonante pelo público
menos informado.
O festival, surgido em 1962, tem
uma alma. É Gilberto Mendes, 77,
autor de "cerca de 200 obras"
-ele desconhece o número exato-, parte delas interpretada
com mais frequência no exterior.
O Yahoo norte-americano traz
um índice de 75 sites em que são
mencionados seu nome ou suas
composições.
Há uma longa história por detrás do surgimento de autores
dessa forma não tão nova assim
de organizar os sons. Fora do Brasil, são as pesquisas do austríaco
Arnold Schoenberg (1874-1951) e
sua Escola de Viena, do francês
Olivier Messiaen (1908-1992) e da
ruptura mais radical com a harmonia baseadas na escala tonal.
No Brasil a ruptura foi outra. A
chegada em 1937 do maestro e
compositor alemão Hans-Joachim Koellreutter, 84, modificou
a percepção da música baseada na
estética nacionalista, defendida
pelos modernistas de 1922, sobretudo por Heitor Villa-Lobos
(1887-1959) e em seguida por Camargo Guarnieri (1907-1993).
Gilberto Mendes foi co-autor do
Manifesto Música Nova (1962) e,
por ser santista, instituiu em Santos o festival, este ano co-patrocinado pela prefeitura daquele município e pelo Ministério da Comunidade Flamenga (Bélgica). O
evento terá, em sete concertos
santistas, trabalhos de 35 compositores. Concertos e workshops
com os convidados são gratuitos.
Mas o festival não é mais a trincheira estética que o marcava de
início. "Ele é uma mostra da multiplicidade de linguagens que caracteriza a música de hoje", diz
seu criador. Compositores como
os brasileiros Henrique Oswald, o
norte-americano Charles Yves ou
o russo Dmitri Chostakovich têm
um espaço que certamente não
lhes abririam nos anos 60.
Olhar com frequência brilhante
de entusiasmo, voz pausada por
temperamento ou para não atrair
uma nova crise de asma, Gilberto
Mendes se define como "um bancário que compôs nas horas vagas". Foi, por 28 anos, funcionário
da Caixa Econômica Federal.
Casado duas vezes, dois filhos,
já foi objeto de uma dissertação
de mestrado e uma tese de doutorado. É tema de três outros trabalhos acadêmicos em curso.
"Isso o envaidece?"
"Não gosto da palavra vaidade,
nem da palavra orgulho", responde, rápido, da cadeira de balanço
no pequeno apartamento em que
mora, no bairro do Gonzaga.
Já lecionou no Departamento
de Música da ECA-USP e nas universidades de Wiscounsin e do
Texas, nos Estados Unidos. Suas
partituras estão parcialmente editadas no Brasil, EUA e Bélgica.
Foi em maio último homenageado pelo Festival de Verão de
São Petersburgo, com a interpretação de cinco canções e mais
"Ulysses em Copacabana, Surfando com James Joyce e Dorothy
Lamour", peça de câmara com
muito humor e ironia, composição encomendada em 1988 pelo
Festival de Patras (Grécia) e que
músicos da Osesp interpretaram
em julho, na Sala São Paulo, no
projeto Criadores do Brasil.
Leitor do inglês Joseph Conrad
(1857-1924), Gilberto Mendes
aponta como os maiores músicos
de todos os tempos, pela ordem,
Bach, Beethoven, Mozart e Stravinsky -mas tem um apego sentimental pelo jazz e pela música
cantada por Fred Astaire.
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