São Paulo, terça-feira, 22 de agosto de 2000


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LIVRO/LANÇAMENTO
Almanaque é fosfosol para a TV brasileira, 50 anos

Reprodução
Programa do Chacrinha, um dos marcos da televisão brasileira, que ganha almanaque aos 50 anos


MARCELO TAS
ESPECIAL PARA A FOLHA

E ste ano cheio de zeros parece não ter fim. Mês que vem, a TV brasileira completa 50 anos. E a sua memória, como quase tudo no país, é um caso de polícia. Acredito que, basicamente, são dois motivos.
Por preguiça ou ignorância (ou uma combinação de ambos), os intelectuais brasileiros ainda não conseguiram produzir livros em número compatível com a importância do veículo no Brasil.
O segundo motivo é de polícia mesmo. A TV brasileira é recordista mundial em número de incêndios. A combinação de incêndios com o avassalador calor tropical derreteu nas prateleiras boa parte do acervo histórico. Na década de 60, era tanto incêndio, que um jornal de São Paulo deu a manchete: "Está no ar mais um incêndio da TV Record".
Com tanta tragédia e pouca informação sobre a TV brasileira, devemos "rrrrrrrrreceber com uma salva de palmas", como diria Chacrinha, um livro como o "Almanaque da TV".
Seu autor, o roteirista Rixa, é uma prova viva da fragilidade da memória televisiva no Brasil. Conheci o rapaz na Rede Globo, em 1986. Eu era o apresentador do "Video Show". O Rixa, moleque de barba rala, antes da chegada dos computadores, era como um "hard disk" da emissora.
Sabia, de cabeça, em que prateleira encontrar a cena do crime de Salomão Hayala, em "O Astro". Ou a bofetada na cara de Odete Roitman. E centenas de cenas desconhecidas, perdidas na memória dos telespectadores. Sua fama começou a circular pelos corredores, e o Rixa passou a ser consultado com frequência.
O que não sabia de cabeça, ele carregava numa mochila, em pastas de papelão, estufadas com manuscritos, papéis datilografados e xerox anotados nas beiradinhas.
No "Almanaque da TV", Rixa organizou e entrega as pérolas que colheu durante todos esses anos de TV Globo. Você acredita que a "pegadinha" foi inventada em 1948? E a "videocassetada", em 1963? Acredite, porque é verdade. Mas, difícil mesmo é acreditar que o Boni é o inventor das chacretes e que a Camila Pitanga já foi paquita da Angélica!
A grande virtude do livro é o amor do autor pelo seu ofício. E justamente aí reside também uma importante lacuna. Inevitavelmente, o livro oferece mais detalhes das histórias da Globo que de outras emissoras. Assim, a primeira metade da história -principalmente as três primeiras décadas- ficam muito mais ricas e saborosas do que os anos 80 e 90.
E é justamente nessas duas últimas décadas que deve estar o "x" para entender a riqueza e miséria do caos televisivo que vivemos hoje. São as décadas mais complexas. Nas quais a qualidade técnica cresceu, o público começou a usar o controle remoto e artistas de outros meios, que não rádio e teatro de revista como os pioneiros, chegaram e criaram novas linguagens para a telinha. E para as futuras telas que virão por aí.
Fica o desafio para os estudiosos que apenas sabem resmungar que a TV é a grande vilã do século. Responsável pela violência, pela eleição de Collor, pelo bode do domingo e até por deixar cachorro vesgo!


Marcelo Tas é apresentador e diretor do "Vitrine", da TV Cultura
Almanaque da TV     Autor: Rixa Editora: Objetiva Quanto: R$ 28,50 (288 págs.)


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