São Paulo, domingo, 22 de agosto de 2004

Texto Anterior | Próximo Texto | Índice

Humor passado a limpo

Livro de desenhista pernambucano contesta data de publicação da primeira charge feita no Brasil

DIEGO ASSIS
DA REPORTAGEM LOCAL

Rebuliço nas artes gráficas. Um desenhista pernambucano quer passar a borracha na história do humor gráfico brasileiro. Para Lailson de Holanda, 51, a primeira charge publicada no país, atribuída a Manuel de Araújo Porto-Alegre, não é exatamente a primeira charge publicada no país.
A tese de Holanda, chargista do "Diário de Pernambuco", sustenta que, seis anos antes do aparecimento de "A Campainha e o Cujo", considerada a pioneira, datada de 1837, o periódico pernambucano "Carcundão" já publicava desenhos de humor criticando a igreja e defensores da monarquia.
Resultado de uma pesquisa encomendada pela Universidade de Alcalá de Henares, na Espanha, o argumento abre o livro "Historia del Humor Gráfico en Brasil", que será lançado em outubro pela espanhola Editorial Milenio e não tem data de publicação por aqui.
Defendida pela primeira vez pelo pesquisador Alfredo de Carvalho, em 1908, a primazia histórica do "Carcundão" havia sido solenemente descartada pelo escritor Herman Lima, autor dos quatro volumes que são considerados até hoje a bíblia do humor gráfico tupiniquim, "A História da Caricatura no Brasil", de 1963.
Para ele, o "Carcundão", que teve só três edições de autoria desconhecida entre abril e maio de 1831, "é um jornalzinho sem maior importância", cuja "única ilustração é uma vinheta xilogravada, com um burro corcunda derrubando a coices uma coluna grega. Como expressão caricatural, é absolutamente nulo".
"[Herman Lima] A descreve de maneira tão errada que com absoluta certeza nunca a viu com seus próprios olhos", rebate agora Lailson. "Se considerarmos que a palavra caricatura é utilizada, na maior parte das vezes, como sendo qualquer tipo de desenho em que a realidade está representada de forma humorística e alegórica, com intenção de crítica política ou social, então os desenhos de "Carcundão" são, efetivamente, as primeiras expressões de humor gráfico na imprensa brasileira."
"Este tipo de polêmica é inútil ", rebate Heliana Angotti Salgueiro, curadora da exposição "A Comédia Urbana: De Daumier a Porto-Alegre", montada no ano passado em São Paulo, na Faap. "Dentro de uma metodologia científica, não se pode defender que essa obra ou aquela foi a "primeira" em nenhuma área do conhecimento. Nunca se deve fechar a questão. As pesquisas avançam."
E completa: "[Os desenhos do "Carcundão'] Aproximam-se mais das vinhetas francesas tipográficas. Porto-Alegre vivenciou o universo da caricatura da primeira metade do século 19 na França e tudo indica que adquiriu um nível de informação que outros no Brasil certamente não tinham".


Texto Anterior: Novelas da semana
Próximo Texto: Humor passado a limpo: Sutilezas da língua dificultam análise
Índice



Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Folhapress.