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CRÍTICA
Um altar sobre as cinzas
SYLVIA COLOMBO
EDITORA-ADJUNTA DA ILUSTRADA
Rafael (Ricardo Darín) está
no fundo do poço. O restaurante da família, sob seu comando, está falido; sua namorada cansou-se de sua apatia amorosa; a filha, de seu descaso; e, ele mesmo,
de seus sonhos malogrados.
Assim como Rafael, seu pai, Nino, também perdeu as ilusões. A
convicção de não se casar com a
companheira de tantos anos hoje
é motivo de remorso, quando a vê
aprisionada pelo mal de Alzheimer, num asilo de anciões.
Pai e filho tateiam atrás de um
tesouro perdido, ainda que já não
tenham certeza sequer se este um
dia chegou a existir. Mais ou menos como parece acontecer com a
Argentina de nossos dias, onde se
passa este "O Filho da Noiva".
O filme chega junto com o espanhol "Fale com Ela" (Almodóvar), com quem curiosamente se
assemelha por trazer dois relacionamentos à beira da destruição e
dois homens que tentam reaprender a conviver com suas parceiras.
Darín, um dos malandros de
"Nove Rainhas" (Fabián Bielinsky), encarna aqui um personagem parecido. É ele quem mais
sente nas entranhas a ruína argentina. Atormenta-se pela falta
de dinheiro, dá e recebe calotes,
suborna a polícia e não hesita em,
para economizar, trocar o mascarpone por requeijão na receita
de tiramissú do restaurante.
Eis que seu pai resolve cumprir
um antigo sonho de sua mãe, casando-se com ela na igreja -ainda que esta, debilitada pela doença, pouco perceba do mundo. Rafael ajuda-o, comovido com a capacidade de amar do velho, tão
contrastante com sua amargura.
Os padres e a ruína financeira
aparecerão como obstáculos, e
Rafael os atropelará com seu humor rancoroso até que ele próprio
é chamado à transformação.
O filme tem excelentes atuações
de Hector Alterio e Norma Aleandro -parceria que deu à "A História Oficial" (Luis Puenzo, 85) o
único Oscar de filme estrangeiro a
uma produção latino-americana.
"O Filho da Noiva" é tristíssimo,
e o sarcasmo e o humor inteligente de seus diálogos não diminuem
sua dramaticidade. Mesmo em
seu caminhar para um desfecho
de tom otimista, não deixa que se
perca de vista a idéia de um sonho
dilacerado, perdido há não muito
tempo. O mesmo do qual parece
ter acordado a Argentina de hoje.
O Filho da Noiva
El Hijo de la Novia
Direção: Juan José Campanella
Produção: Argentina/Espanha, 2001
Com: Ricardo Darín, Norma Aleandro
Quando: a partir de hoje nos cines Frei
Caneca Unibanco Arteplex, Jardim Sul e
circuito
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