São Paulo, sexta-feira, 23 de janeiro de 2009

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Crítica/"Juventude"

Filme é ponto alto de Domingos Oliveira

Com olhar irônico e caloroso, longa sobre três amigos que se reúnem para relembrar o passado faz uma celebração da vida

JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA

O título pode parecer irônico, afinal trata-se do encontro de três amigos que estão beirando os 70 anos, mas é antes poético.
Juventude aqui, mais do que uma idade cronológica, significa uma chama vital que sobrevive às intempéries da existência. O filme de Domingos Oliveira é a tentativa de apreender essa chama. O negociante milionário Davi (Paulo José) recebe em sua luxuosa casa de campo o cardiologista Ulisses (Aderbal Freire Filho) e o diretor de teatro e cinema Antonio (Domingos Oliveira) para um fim de semana de bebedeira e lembranças. Mais de meio século antes, eles participaram juntos no ginásio de uma montagem de "A Ceia dos Cardeais", do português Julio Diniz (1839-71).
No inevitável balanço de vida suscitado pelo reencontro, delineiam-se as diferenças entre os amigos quanto a um tema central, o amor às mulheres, que se revela o eixo do filme, como aliás de toda a obra de Domingos Oliveira.
Claro que nesse acerto de contas com o passado entram outras questões: os projetos de vida, a militância política, o sonho de mudar o mundo.
O cineasta, autor também da peça de teatro em que o filme se baseia, conduz com segurança e delicadeza esse "cinema de câmara" (no sentido em que se fala de "música de câmara"), ao mesmo tempo íntimo e de escopo amplo, universal.
Já se detectou no cinema de Oliveira a influência de Truffaut (sobretudo nos primeiros filmes) e, cada vez mais, de Woody Allen, com quem o diretor brasileiro comparte a visão calorosa e irônica da vida, além da verborragia.
Em "Juventude", valorizado pela categoria e pela entrega dos atores, há ecos também de "A Comilança", só que em vez do hedonismo apocalíptico do filme de Marco Ferreri o que se vê aqui, e que se revela no literalmente iluminado plano final, é uma ode à vida.
Enfraquece o todo um ocasional deslize para a autocomplacência, problema que afeta outros trabalhos do diretor. As formulações grandiosas -"a nossa geração isso, a nossa geração aquilo"- acabam por cansar o espectador, a não ser quando têm um tom derrisório, como esta, marota: "Nossa geração queria ser da máfia, mas nós só vimos os filmes".
Seja como for, Domingos Oliveira, depois de ficar 20 anos sem filmar (entre 1978 e 1998), vem construindo na última década uma das obras mais sólidas e pessoais do cinema brasileiro, e "Juventude" é um ponto alto dessa trajetória.


JUVENTUDE
Produção: Brasil, 2008
Direção: Domingos Oliveira
Com: Paulo José, Domingos Oliveira, Aderbal Freire Filho
Onde: Espaço Unibanco Augusta 3 e HSBC Belas Artes/Sala Aleijadinho
Classificação: não indicado a menores de 12 anos
Avaliação: bom



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