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Rock é pano de fundo de livro policial
"Caso Perdido", do colunista do "Miami Herald" Carl Hiaasen, usa referências pop em história sobre morte de vocalista de banda
Romance sobre obituarista que suspeita de afogamento de ex-estrela do rock rendeu até uma música de verdade, gravada por Warren Zevon
RAQUEL COZER
DA REPORTAGEM LOCAL
O miniprefácio de "Caso Perdido", do norte-americano Carl
Hiaasen, esclarece que aquela é
uma obra de ficção. "No entanto", segue o texto, "o episódio
do lagarto congelado foi vagamente inspirado no falecimento, na vida real, de um voraz lagarto monitor Savannah chamado Claw, que agora dorme
numa embalagem de sorvete".
O trecho omite que, afora a
história verídica do réptil (à
qual voltaremos mais à frente),
o romance policial lançado nos
EUA em 2002 e que chega ao
Brasil pela Companhia das Letras é repleto de remissões que
fãs mais atentos do rock não
deixarão passar em branco.
A começar pelo nome original do livro, "Basket Case". Para dar veracidade à trama do
obituarista que investiga a
morte de Jimmy Stoma, fictício
ex-vocalista da fictícia Slut
Puppies, o autor rascunhou
uma letra de música e a entregou ao cantor Warren Zevon
-conhecido nos anos 70 com o
hit "Werewolves of London". A
faixa "Basket Case" acabaria
entrando no álbum "My Ride's
Here" (2002), um dos últimos
de Zevon, que morreria com
câncer, aos 56, um ano depois.
"Warren e eu éramos bons
amigos. Achei que seria divertido pegar os versos que tinha escrito como se fossem de Jimmy
e transformá-los em algo real, e
Warren entrou no espírito da
coisa. Ele acabou criando um
solo de guitarra incrível", diz
Hiaasen (pronuncia-se "raiassã") à Folha, por e-mail.
Referências musicais voltam
em momentos como a entrevista (fictícia, claro) de Jimmy
Stoma à "Rolling Stone". Elas
ajudam ainda a ilustrar um hábito extravagante do protagonista, o repórter Jack Tagger
-desde que foi relegado à seção de obituários, ele não consegue ouvir a idade de alguém
sem associá-la à idade com que
morreram alguns de seus ídolos. "Hendrix Joplin Jones
Morrison Cobain..." é tudo o
que ele pensa quando sua editora lhe diz que tem 27 anos.
Elvis não morreu
Colunista do "Miami Herald"
e autor de best-sellers como
"Caça aos Turistas" e "Striptease", Hiaasen emprestou ao protagonista experiências próprias. "Ao longo dos anos, escrevi alguns poucos obituários.
E sempre pensei o que seria de
mim, ou de qualquer um, se tivesse de escrever sobre a morte
diariamente", diz o autor.
O personagem Jack Tagger
reproduz um lapso do autor, de
achar que Elvis Presley morreu
aos 46 -na verdade, o cantor tinha 42 anos na ocasião de sua
morte, em 1977. "A princípio foi
um erro. Depois achei que seria
apropriado mantê-lo na lógica
de um personagem obcecado
pela morte. Poucos leitores
perceberam isso", diz Hiaasen
(talvez, especula, por acharem
que Elvis não morreu).
No romance, o músico
Jimmy Stoma está há anos
afastado dos holofotes quando,
aos 39, sofre um misterioso acidente nas Bahamas. A morte
repercute em veículos como a
"Rolling Stone" e o "New York
Times" só depois de Tagger escrever um obituário no pequeno "Union-Register", na Flórida -cidade que sedia quase todas as histórias de Hiaasen.
"Mortes estranhas de estrelas do rock são uma espécie de
clichê, então resolvi partir disso. O engraçado no rock'n'roll é
que a morte é geralmente um
bom passo na carreira", avalia.
A morte dá o tom do humor
do livro, e não é diferente com o
lagarto citado no prefácio, cuja
permanência no congelador será providencial, a certa altura
do romance, para o protagonista. A bizarria tem origem num
caso que, garante Hiaasen,
aconteceu com um amigo.
"Ele tinha um lagarto que
morreu de ataque cardíaco. Como sua casa tinha sido assaltada fazia pouco tempo, resolveu
mantê-lo no freezer para usá-lo
para assustar bandidos, se preciso." O plano não deu tão certo
quanto daria em "Caso Perdido" -na história real, um queda de energia fez o lagarto descongelar, e seu dono precisou
se livrar dele o quanto antes...
"Striptease"
Graças ao filme com Demi
Moore, em 1996, "Striptease"
tornou-se o romance mais conhecido de Hiaasen. Mas ele renega o resultado cinematográfico da história sobre a mulher
levada, por adversidades da vida, a fazer o que antecipa o título. "Andy Bergman [diretor] fez
um primeiro esboço excelente.
Mas o resultado final foi certamente uma coisa que eu nunca
escreveria. Lidar com Hollywood pode ser algo doloroso..."
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