São Paulo, quinta-feira, 23 de março de 2000


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CRÍTICA
Capital faz "Acústico" para constranger nossos filhos

especial para a Folha

O Capital Inicial, aquela banda de Brasília cujo trademark é "eh-eh-eh/ô-ô-ô-ô/ah-ah-ah-ah" ou volteios em torno, esteve anteontem no teatro Mars, em São Paulo, para gravar seu primeiro "Acústico" -o formato popularizado pela MTV.
Sem sopros ou cordas, uma decisão sábia, a banda, que não tem mais o original Bozzo Barreti, tocou reforçada pelo produtor Marcelo Sussekind (do último CD do Ira!), pelo guitarrista Kiko Zambianchi, pelo percussionista Deni Conceição e pelo tecladista Aislam Gomes, ex-fã recrutado por conhecer melhor as músicas do Capital do que o próprio grupo.
O disco sai em fim de maio, junto com a exibição do "Acústico".
Por alguns momentos, estar no Mars significou voltar aos 80, entrar no velho prédio sem elevador do Jardim São Paulo, dormir com a tchula tendo a 89 FM como trilha. E isso era bom, donde é difícil desgostar do Capital.
Menos por virtude deles, é verdade. Cheio de hits dos 80, como "Fátima", "Veraneio Vascaína" (faixa que chegou a ser censurada e que fez com que a PolyGram colocasse aquela tarja de advertência na capa do vinil), "Fogo" etc., o repertório confirmou a pobreza inescapável das letras.
Pode-se dizer que "Fátima" não é pior que "Ana Júlia", do Los Hermanos, e que o conjunto tem refrões fortes, mas "Procuramos independência/ Acreditamos na distância entre nós" ("Independência"), "Só um leve desespero/ Que me leve/ Que me leve daqui ("Leve Desespero"), ou as talvez 25 vezes que "1999" é repetido ("1999") não classificariam o grupo nem no Fico.
Mas foi tudo fofo, para roubar a expressão de um colega. Dinho não vestia pelúcia, mas sorria seu belo sorriso usado até quando critica a polícia; o cenário evocava a parede de Athos Bulcão, um logo para iniciados do DF; Zambianchi ganhou homenagem com a inclusão de "Primeiros Erros" (fez a segunda voz, mais alta); Zélia Duncan surgiu para lembrar o colégio Marista; Loro Jones parou intempestivamente uma música, reclamando da afinação do violão.
E os arranjos, calcados em violão e em efeitos sutis na guitarra de Sussekind -inspirados talvez em Donald Fagen-, funcionaram, ainda que a seção percussiva estivesse muito à frente.
Ao apresentar as faixas, Dinho dizia: "Essa foi feita há um zilhão de anos" etc. Não soava cínico -como Cadão Volpato, num recente show do Fellini-, nem mesmo exagerado. Capital Inicial é tão datado quanto a Jovem Guarda. De tempos em tempos, fazem uma festa no que restou do Aero Anta (ou do QG, ou da Tífon, ou do Raio Laser), colocam-nos a todos lá dentro, fazem-nos cantar alegremente os refrões, para constrangimento de nossos filhos e sobrinhos. (PAULO VIEIRA)


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