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Tanga de gambá made in USA
GILBERTO FELISBERTO VASCONCELLOS
especial para a Folha
A Ilustrada solicitou-me artigo
sobre "O Que É Isso, Companheiro?", que pode ganhar ou não hoje
o Oscar de filme estrangeiro.
A consagração não mudará um
milímetro o que penso a respeito,
assim como minha modesta opinião não interfere em nada na recusa ou não do prêmio cobiçado.
Bad movie.
O único plano que presta é o do
chofer de táxi falando sobre o sequestro do embaixador americano, cujo ator é uma espécie de
sub-Marlon Brando do Francis
Coppola para nos fazer esquecer, e
quiçá perdoar, o papelão do professor Lincoln Gordon em 64,
conspirando safadamente na derrubada de João Goulart.
O grande problema estético do
filme é que o talento reprodutor de
Bruno Barreto não foi além da reportagem série C de Fernando Gabeira, em que não existe nenhuma
reflexão histórica acerca da ditadura de 1964, portanto o leitor (e,
consequentemente, o espectador)
não fica sabendo o que gerou a luta armada no Brasil.
Tudo começaria em 1968, ao
som do sambinha "Garota de Ipanema", o que é um equívoco de
periodização partilhado tanto pela
contracultura pop quanto pela sociologia marxóloga colonizada da
USP. Com esse ponto de partida, o
filme de Barreto (a despeito de citar o cartaz "Deus e o Diabo na
Terra do Sol", de Glauber Rocha)
pode ser interpretado como uma
tentativa de livrar a cara da CIA na
deflagração do golpe de 64.
Por que Barreto não pôs o cartaz
de "Terra em Transe"?
Este filme causou ódio em Gabeira em 1967, tanto que pediu (no
MAM do Rio) para "Terra em
Transe" ser jogado no mar.
Macumba para turista. Em tudo,
no filme de Barreto, o idioma inglês é melhor do que o português.
Os atores estão mal dirigidos por
causa do vício da telenovela na
construção dos diálogos péssimos.
A única locução que se salva é a
carta escrita em inglês do embaixador para sua mulher, a Julieta
dos Espíritos frequentadora do cineminha de Harry Stone, o doge
dandy americano aculturado pela
tropicanalha de Gilberto Gil.
De resto, é por isso que, do ponto de vista visual, a natureza do
Rio vira cartão postal para fazer
sucesso nos EUA.
Na acústica, o desacerto ainda é
maior, porque não evoca o hino
nacional e cita de maneira infeliz a
Internacional Comunista, apresentando de modo mitômano o
intelectual terrorista Gabeira como se fosse o Caetano Veloso que
soubesse falar inglês.
O problema dessa onda "tela
quente" é apresentar a sociedade
brasileira estruturada pela polícia.
No caso do filme de Barreto, a relação entre civis e militares mereceria um tratamento mais aprofundado, sobretudo porque a democracia civil destruiu o cinema
nacional e vendeu o patrimônio
bioenergético do país.
Nascido no cinema, Bruno Barreto faria um filme mais interessante se tivesse estudado o que
Glauber deixou escrito sobre Gabeira, a luta armada e o exílio. Ele
preferiu no entanto a mistificação
midiática do livro "O Que É Isso,
Companheiro?" (aliás, título horrível), que é uma espécie de "teoria
da dependência" da tanga udistoque de Gabeira.
O final do filme é uma apologia
do retorno à democracia desnacionalizada de 1989, o ano das eleições (Gabeira foi candidato a presidente da República), cujas urnas
fraudadas consagraram a estética
da telenovela de Fernando Collor,
o videopata que mandou tacar fogo na Embrafilme.
Moral da história: dificilmente
haverá renascimento do cinema
brasileiro sem renascimento do
nacionalismo.
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