São Paulo, sábado, 23 de abril de 2011

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ENTREVISTA LYGIA FAGUNDES TELLES

A ansiedade é o maior perigo para um escritor


AUTORA DESCREVE INFLUÊNCIA DA FAMÍLIA E AMIGOS NO PROCESSO CRIATIVO E RELATA IMPRESSÕES SOBRE A NOVA GERAÇÃO LITERÁRIA


DE SÃO PAULO

Autora de 19 livros de contos e quatro romances, Lygia Fagundes Telles cismou que seria escritora ainda menina. Diz, hoje, que a teimosia juvenil não rendeu boa escrita. "Para escrever, é preciso, antes, ler muito, criar parâmetros. A pressa faz muito mal ao escritor", afirma, referindo-se a si, mas também aos jovens autores contemporâneos. (ANA PAULA SOUSA)

 


Folha - Por que a senhora modificou "A Disciplina do Amor", de 1980?
Lygia Fagundes Telles -
Porque, ao receber a última edição, que tinha sido dedicada a ele, meu filho fez duas observações sobre o livro. Ele me perguntou por que eu colocava tantas datas, sendo as datas fictícias, e também por que eu não punha os nomes dos personagens, e sim apenas as iniciais.
Percebi que ele tinha razão. Nesta nova edição, saíram quase todas as datas e, no lugar de letras como HH ou PE, aparecem os nomes de Hilda Hilst e Paulo Emílio.

A senhora costumava submeter seus escritos a seu filho?
Sim, ele e o Paulo [Emílio Salles Gomes] foram os meus grandes leitores. Liam tudo e davam muita opinião.

A senhora às vezes ficava desconfortável com a opinião deles?
Nunca. Mas às vezes concordava e às vezes não. O Paulo teve grande influência sobre minha obra.

Com ideias inclusive, não?
Sim, tem um conto, o "Relga", que nasceu de uma história que ele me contou. Ele me ligou de Paris para dizer que tinha lido no jornal uma notícia pequenina sobre um homem, filho de pai brasileiro e mãe alemã, que, durante a Segunda Guerra, foi para Düsseldorf e se casou com uma moça que não tinha uma perna.
Na noite de núpcias, ele roubou a perna mecânica dela. Eu pedia mais detalhes e ele dizia: "Cuco, não tenho detalhes. Sente e escreva". Ele me chamava de Cuco.

Sem as conversas com o Goffredo e o Paulo ficou mais difícil escrever?
Muito mais. Mas foi preciso continuar.

A senhora começou a escrever ainda menina. Qual a impressão que tem dos jovens escritores de hoje?
Eles me parecem ainda mais ansiosos do que nós éramos. Ansiosos por escrever e por aparecer. E a ansiedade é o maior perigo para um escritor.

A senhora foi ansiosa no início?
Muito. Tanto que os meus primeiros livros desapareceram.

A senhora tem lido os jovens autores brasileiros?
Recebo muito livro de jovens escritores e também muita coisa que chega via Academia [Brasileira de Letras]. Mas, se eu fosse ler tudo isso, eu não faria outra coisa que não ler. E, bem, já não tenho muitos anos pela frente. Tenho que aproveitá-los...

Como a senhora procura aproveitá-los?
Trabalhando nos meus textos, lendo, estando com os amigos. Também gostava muito de fazer caminhadas, mas não posso mais. Fui esportista, sabia?

A senhora fez educação física, não?
Sim! Veja este dedo torto: quebrei jogando vôlei. Também era rápida na corrida. Na faculdade, fui medalhista nos 400 metros rasos.

E a senhora fazia grande sucesso entre os rapazes do largo São Francisco...
(risos) Eu era bonitinha. Mas quando meu amigo Ives Gandra falou, no outro dia, que eu era a mais bonita da faculdade, tive que lembrá-lo de que éramos só umas sete ou oito mulheres. Convenhamos: não era uma vantagem tão grande assim!


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