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MÚSICA/LANÇAMENTO
Macy Gray traduz suas experiências e conflitos em funk, hip hop, rock e jazz
Garota problema
DENISE MOTA
EDITORA-ASSISTENTE DA ILUSTRADA
Graças à personalíssima voz,
Macy Gray vem sendo incansavelmente comparada a Patti
LaBelle, Tina Turner, Billie Holiday. Parece haver um pouco dessas três em "The Problem with
Being Myself", terceiro CD da
cantora, em que voz, estilo e drama se complementam.
A voz é a chave para entrar no
mundo de Macy Gray, mas antes
mesmo de abrir a boca a cantora
costuma se fazer notar: figurinos
extravagantes e gestos pouco
comportados são a normativa
que a acompanha (no Free Jazz de
2001, os brasileiros assistiram a
uma tentativa de strip-tease de
sua banda, por exemplo).
Somada à voz de Pato Donald
com que adentrou a música pop,
Gray poderia não passar de uma
caricatura, interessante para refrescar a indústria musical no setor r&b -onde originalidade de
mais e bom-mocismo de menos é
artefato raro. Por baixo da fantasia, porém, a cantora tem estofo
para não parar de escrever boas
canções, e a tal voz é instrumento
versátil e muito bem utilizado.
Mas Gray -mãe divorciada de
três crianças e dona de um café
em Hollywood, nas horas vagas- chega ao terceiro álbum
disposta a discutir "os problemas
de ser ela mesma".
A ver. No novo disco, faz o que
sabe bem: alterna seu peculiar
timbre entre investidas roqueiras,
canções de melodia descompromissada e conteúdo para lá de
sombrio, entra de sola no funk e
no hip hop e homenageia criativamente uma de suas maiores inspirações com "Screamin'", bem à la
Jackson Five.
Passados os tempos de cantoria
"por cem dólares" -como costuma contar-, em bares do circuito hoteleiro de Los Angeles (onde
o cardápio oscilava entre standards do jazz e canções de Frank
Sinatra), e depois de dois álbuns
na praça (um dos quais, o sucesso
de estréia "On How Life Is", alçou-a à condição de "diva" do
funk e soul e lhe deu um
Grammy), Gray começa a falar de
suas inquietações hoje em dia cravando que "não é o dinheiro" ("It
Ain't the Money") -o problema
ou a solução?
Depois comenta os tombos da
vida que a transformaram no que
é, remói levemente a dor de cotovelo de praxe do r&b ("Ela pode
ser mais bonita do que eu,/ mas
não escreve canções sobre você",
em "She Don't Write Songs about
You"), mergulha numa infância
tão problemática quanto tola
("My Fondest Childhood Memories") e experimenta a felicidade,
ainda que artificial ("Meu limite é
felicidade por um dia ou dois/ Eu
sou "junkie'/E você?", pergunta
em "Happiness") -reforçada pela convicção expressada momentos antes de ser amada porque "é
Macy Gray".
Nem com esse pé na egolatria a
música deixa de ser das melhores,
e é isso o que faz do CD a continuação da feliz carreira da cantora até aqui. O problema em ser
Macy Gray, ao fim, talvez seja apenas o fato de que ela anda se preocupando demais com isso.
The Trouble with Being Myself
Artista: Macy Gray
Lançamento: Sony
Quanto: R$ 27, em média
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