São Paulo, sábado, 23 de maio de 2009

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Crítica

"Fundação" é ficção científica "sui generis"

ROBERTO DE SOUSA CAUSO
ESPECIAL PARA A FOLHA

N o mundo todo, o nome Isaac Asimov (1920-1992) foi sinônimo de ficção científica. Escritor prolífico, ele foi também importante divulgador científico. Achava-se um autor de FC antes de tudo, e a "Trilogia Fundação" é considerada sua obra mais importante. Escrita como uma série na revista "Astounding Stories", de 1942 a 1953, recebeu em 1966 um Prêmio Hugo especial e virou leitura obrigatória para se entender a evolução do gênero no século 20.
A série é uma "space opera" -de FC aventuresca em escala galáctica- "sui generis": sua qualidade cerebral a destaca de exemplos comuns. Asimov avaliou: "Os três volumes consistiam em pensamentos e conversações. Nenhuma ação nem suspense físico". Se literatura é mais que linguagem, ele foi um gênio da exposição narrativa, e a leitura da trilogia excita e estimula o intelecto. Um paradoxo.
A trilogia reconta a queda do Império Romano, imaginando que o fim do Império Galáctico foi previsto pelo psico-historiador Hari Seldon, que estabelece duas fundações nos limites da galáxia para encurtar um período de trevas de 30 mil anos para apenas mil. A psico-história é um conceito fabuloso, e ecos da ideia de que a matemática poderia prever as ações das massas humanas aparecem nas teorias do caos e da emergência, e até na economia.
Asimov criou várias séries de histórias e romances -além de "Fundação", a série dos robôs e a do Império Galáctico. Nos anos 90, resolveu fundir as três e, no processo, teve de retornar à trilogia e acertar detalhes para manter a coerência. A edição brasileira anterior a esta é dos anos 70, pela Hemus, e não contemplava essas alterações.
Outro trunfo da atual edição, da Aleph, são as traduções de Fábio Fernandes e Marcelo Barbão, mais fluentes que a da Hemus, mas carentes de revisão estilística. A Aleph também publica pela primeira vez a trilogia em três livros separados.
"Fundação" é o ápice do futuro de consenso, tendência maior da era de ouro da FC americana (1938-48): o espaço é o destino manifesto da humanidade, onde sua expansão recebe pouca resistência e o espírito científico triunfa. A trama salta séculos, conforme o Império Galáctico se desfaz e os agentes da Fundação recebem orientações gravadas de Seldon em momento-chaves previstos pela psico-história. Não há só um herói (agentes da Fundação variam com as gerações), mas sim um único vilão, o Mulo, que surge no terceiro volume.
O Mulo é um mutante que lê e domina as mentes -uma singularidade humana que está além do Plano Seldon, e metáfora asimoviana para o führer do nazifascismo. Embora Seldon tivesse um ás na manga, derrotá-lo está fora de qualquer determinismo histórico. Como continua sendo.

ROBERTO DE SOUSA CAUSO é escritor, autor de "Ficção Científica, Fantasia e Horror no Brasil: 1875 a 1950" (ed. UFMG).


FUNDAÇÃO, FUNDAÇÃO E IMPÉRIO e SEGUNDA FUNDAÇÃO
Autor:
Isaac Asimov
Tradução: Fábio Fernandes (vol. 1 e 2) e Marcelo Barbão (vol. 3)
Editora: Aleph
Quanto: R$ 39 (cerca de 240 págs.) cada
Avaliação: ótimo



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