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GASTRONOMIA
Ponto Chic,
75, brinda
com bauru
CASSIANO ELEK MACHADO
da Redação
Era uma noite de novembro de
1936. Um grupo de estudantes estava reunido para combinar os detalhes da eleição da diretoria do
Centro Acadêmico 11 de Agosto.
Como o Estado Novo de Getúlio
Vargas reprimia as reuniões estudantis, o grupo se refugiou no esconderijo preferido: o Ponto Chic
do Largo do Paissandu.
Foi no final dessa vigília, que durou três dias e três noites, que Casimiro Pinto Neto inventou um dos
sanduíches mais famosos de São
Paulo: sua excelência, o bauru.
A história, que muitos conheceram distorcida, ganha seus contornos definitivos com a publicação do livro "Ponto Chic - Um Bar
na História da Cidade", que o jornalista Angelo Iacocca está organizando para comemorar os recém-completados 75 anos do
bar-restaurante-boteco.
De acordo com Iacocca, a edição
de luxo, que deve ser lançada em
setembro pela editora Melhoramentos, não é uma mera historiografia da casa.
Com uma pesquisa histórica e
iconográfica aprofundada, a obra
pretende traçar um painel cultural
da cidade neste século, tendo o
Ponto Chic como fio condutor.
O entrelaçamento da história da
cidade e do, digamos, bar, começa
no significativo ano de 1922.
Quando foi aberto, o Ponto Chic
não tinha nome -era apenas um
ponto chique, em que o balcão era
de mármore, os azulejos, franceses
e os lustres, de cristal.
Mário e Oswald de Andrade,
Murilo Mendes e outros artífices
do modernismo, que surgira meses antes do bar, foram alguns dos
frequentadores que colaboraram
para que o nome se definisse como
Ponto Chic.
Tarsila do Amaral, Anita Malfatti
e todas as demais, ficavam de fora.
Antonio Alves de Souza, que começou a trabalhar no local em
1948, passou por todas as funções
até assumir a direção da casa, explica que até então as mulheres
não podiam entrar no bar.
Nem mesmo as prostitutas, que
segundo Souza marcavam ponto
no Largo do Paissandu em grande
escala até o começo dos anos 50
-o bordel da "dona Fifi" ficava
sobre o Ponto Chic.
Foi Souza quem desenhou a atual
configuração do cardápio do PC,
apelido do bar.
Quando ele começou a trabalhar
na casa, o bauru criado por Casimiro Pinto -o primeiro Repórter
Esso, em 1941- já fazia sucesso,
ao lado da fritada (queijo, presunto, ovos e manteiga em camadas) e
do mexido (presunto picado envolvido com queijo e tomate), pratos que continuam sendo generosamente servidos. Mas o cardápio
não passava de sanduíches e ovos.
Seu Antonio, que ainda come seu
bauru dia sim, dia não, foi incrementando gradualmente a carta de
opções, que hoje tem mais de 50
escolhas, quase todas assentadas
na tradição.
Mas a maior mudança não foi
gastronômica. Em 1978, quando
morreu o antigo dono, a casa fechou. Os garçons ficaram tão revoltados que quebraram tudo.
O restaurante renasceu em Perdizes. Só em 1981, a casa do Paissandu reabriu.
O Ponto Chic deixou de ser chique, mas não perdeu qualidade
nem clientela.
Hoje, com seus 75 anos, o PC é
frequentado por boêmios e curiosos de todas as faixas etárias e monetárias. Muitos deles vêm sedentos pelo ótimo chope, pelo bauru,
pelo rococó (com alice, gorgonzola e rosbife) e para ver, mesmo sem
saber, um cenário que, entre outras façanhas, inspirou Adoniram
Barbosa a compor "Viaduto Santa
Ifigênia" nas mesas do bar.
Restaurante: Ponto Chic
Onde: Largo do Paissandu, 27, tel.
011/222-6528, centro; largo Padre Péricles,
139, tel. 011/826-0500, Perdizes, e mais
quatro endereços
Quando: diariamente, das 10h às 2h
(Paissandu não abre aos domingos)
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