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Horgan afirma que a ciência chegou ao seu limite
MAURICIO TUFFANI
Editor-assistente de Ciência
Numa atitude
típica de final de
milênio (se é
que assistimos a
tantos milênios
assim para poder comparar),
John Horgan, editor da revista
norte-americana "Scientific
American", se esforça, em seu livro "O Fim da Ciência", para fazer o leitor acreditar que não há
lugar no futuro para novas idéias
científicas fundamentais, como as
leis do movimento de Newton, a
relatividade de Einstein e a seleção
natural de Darwin.
Horgan é um dos mais talentosos jornalistas científicos da atualidade. Seu livro reúne entrevistas
que ele fez com alguns dos principais nomes do mundo da ciência
atual: os físicos Stephen Hawking,
Murray Gell-Mann e Fred Hoyle,
os biólogos Stephen Jay Gould, Richard Dawkins e Edward Wilson,
além de vários outros.
No entanto, o parti pris de Horgan com relação ao limite do desenvolvimento científico pouco
deixa de espaço reflexivo para o
leitor desavisado. Seu ponto de vista se espalha como uma metástase
no relato de cada entrevista, reforçando a crença de que os cientistas
atuais padecem do mesmo peso da
influência atribuída por Harold
Bloom, em "The Anxiety of Influence" ("A Angústia da Influência", editora Imago), a Dante, Shakespeare e Milton sobre os poetas
atuais, os "retardatários".
"Os cientistas modernos também
são retardatários, e sua carga é
muito mais pesada do que a dos
poetas", diz Horgan. Os pesquisadores atuais, segundo ele, têm de
aturar o fardo da herança de Newton, Einstein, Darwin e de outros
mestres: a menos nobre tarefa de
apenas resolver quebra-cabeças
dos grandes modelos ou paradigmas criados. Trata-se da atividade
definida pelo filósofo Thomas
Kuhn, outro entrevistado, como
"ciência normal" em "The Structure of Scientific Revolutions" ("A
Estrutura das Revoluções Científicas", editora Perspectiva).
Mas Horgan parece se esquecer
que Kuhn -que ele parafraseia
para justificar sua tese- também
descrevera a "ciência em crise", na
qual proliferam anomalias nos paradigmas. Com o crescimento dessas anomalias e com o aparecimento de novas gerações de cientistas menos dispostas a tolerá-las,
criam-se as condições para a elaboração de novos paradigmas
científicos, que expliquem tudo o
que os anteriores explicavam sem
tratar as antigas anomalias como
corpos estranhos à teoria.
Há cerca de 80 anos, após um
longo período de invencibilidade à
frente dos tabuleiros, o cubano José Raoúl Capablanca, então campeão mundial de xadrez, afirmou
que o conhecimento técnico enxadrístico havia chegado ao seu limite. No entanto, ele viveu o suficiente para ser trucidado sob as mesmas regras do jogo e também para
assistir ao nascimento de novas
concepções estratégicas.
Muito além das restritas 64 casas
que até hoje pregam surpresas, a
ciência possui chances infinitamente maiores de combinações e
ciladas. Talvez o próprio Horgan
possa testemunhar a ciência desmentir seu livro, que, bem ou mal,
vale pelas entrevistas.
Livro: O Fim da Ciência - Uma Discussão
sobre os Limites do Conhecimento
Científico
Autor: John Horgan
Lançamento: Companhia das Letras
Quanto: R$ 27,50 (363 págs.)
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