São Paulo, quarta-feira, 23 de julho de 2008

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Entrevista Fernando Meirelles

Concorrência para a Globo é sofrimento positivo

Fernando Meirelles começa a gravar "Som e Fúria", primeira minissérie independente do canal, e diz que, com novelas das outras redes, foi difícil escalar atores, mas a disputa por ibope é boa para "movimentar a TV'

Apu Gomes/Folha Imagem
O diretor vê, no monitor, gravação de cena com Felipe Camargo e Pedro Paulo Rangel no Teatro Municipal de SP

LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

Fernando Meirelles está viciado em brigas entre irmãos, crimes passionais e luta de espada. Oito anos após produzir para a Globo o especial "Palace 2", embrião do longa-metragem "Cidade de Deus", ele vira agora suas lentes para os ódios e amores skakespearianos.
O cineasta deu início na semana passada às gravações de "Som e Fúria", seu novo projeto para a emissora, sobre uma companhia de teatro que monta peças de Shakespeare. O cenário principal é o Teatro Municipal de São Paulo, que reservou para esse trabalho tardes livres e, especialmente, as madrugadas. Foi na virada de quinta para sexta passada que a Folha acompanhou Meirelles na direção de cenas com Andréa Beltrão, Daniel de Oliveira, Chris Couto, Felipe Camargo, Pedro Paulo Rangel e Maria Flor, entre outros.
Essa será a primeira minissérie da Globo realizada por uma produtora independente. Até então, a parceria com a O2, de Meirelles, produziu, além de "Palace 2", os seriados "Cidade dos Homens" e "Antônia".
Em um intervalo das gravações de "Som e Fúria", ao lado da escadaria do Municipal, Meirelles falou à Folha sobre a minissérie, seu próximo longa, também relacionado a Shakespeare (no qual ele trabalhará após a estréia de "Ensaio sobre a Cegueira", em setembro), a concorrência que a Globo enfrenta, o presidente do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, "que daria um vilão sensacional", e seu voto nas próximas eleições, que "seria de Alckmin, mas não vai ser mais por causa do [candidato a vice] Campos Machado".

 

FOLHA - Você vai trabalhar com Shakespeare nesta minissérie e em seu próximo filme. Por quê?
FERNANDO MEIRELLES
- Sempre gostei de Shakespeare. Li o romance "Trabalhos de Amor Perdido", do Jorge Furtado, de 2006, versão dessa peça [homônima] do Shakespeare [e do qual o filme será adaptado], e isso me despertou interesse maior. Voltei a ler peças e ver as montagens em São Paulo. Shakespeare é como droga, quanto mais você usa, mais quer. Estou nessa fase de encantamento.

FOLHA - "Palace 2" (2000) foi uma das primeiras parcerias da TV aberta com produção independente. O espaço a independentes já é ideal?
MEIRELLES
- A produção independente nos últimos dez anos passou a existir. A TV a cabo trabalha com independentes, sem falar da internet. O mercado explodiu. A Globo, curiosamente, não. Contrata pouca produção independente. Essa minissérie é legal para mostrar que é possível que independentes façam projetos grandes.

FOLHA - O espaço para produção independente na TV deverá crescer?
MEIRELLES
- É uma questão de ciências. Se essa minissérie for bem de ibope, certamente eles se entusiasmam. Tinha uma resistência para as primeiras séries. Deu certo o primeiro ano, contrataram o segundo, e assim foi. E os outros canais usam [produção independente]. O elenco dessa minissérie é grande, não imagina como foi difícil montar. Todo mundo em quem a gente pensou estava ocupado.

FOLHA - Falta ator no mercado?
MEIRELLES
- Não tem ator. Com as novelas da Record, Band, Globo, do SBT, as coisas de internet... Agora a HBO está produzindo. Ainda não conseguimos contratar todo o elenco da minissérie, está todo mundo comprometido. Não tem atores [disponíveis] no Brasil.

FOLHA - Não é uma falha do garimpo, de achar gente nova no teatro?
MEIRELLES
- Mesmo assim está complicado. Nesta minissérie, na verdade, temos sete, oito nomes grandes e 110 nomes que quase ninguém conhece. Vai ser o lançamento de uma safra.

FOLHA - O que acha de projetos de lei que estabelecem que as emissoras exibam cotas obrigatórias de produção independente?
MEIRELLES
- Teoricamente o mercado deve se regulamentar, mas haver uma certa obrigatoriedade de espaço para a produção brasileira é importante. Senão essas emissoras estrangeiras pegam enlatados e põe legendas. Sou favorável a uma cota. Não metade da programação, mas dentro do razoável. E isso já garante espaço a independentes, porque fora as redes abertas, os outros canais não têm estrutura de produção.

FOLHA - Novas séries da Globo têm enfrentando problema com ibope. Como produtor independente, você deve considerar a concorrência positiva. Por outro lado, sua minissérie pode ter mais dificuldades...
MEIRELLES
- Quando uma emissora se movimenta, a outra é obrigada a se movimentar. Embora pareça ruim para a Globo, é bom porque está buscando novos formatos. É um sofrimento positivo, e quem ganha é o público. A gente está fazendo essa minissérie pensando em audiência, claro, é TV. Mas sei que a concorrência não é mole.


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