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TEATRO CRÍTICA
"Três Irmãs" mostra o verso do tédio em Tchecov
NELSON DE SÁ
da Reportagem Local
O que define "As Três Irmãs",
de Anton Tchecov, em nova
montagem, é a atuação de um homem, num papel menor. Fernando Alves Pinto poderia fazer, como é corrente com Solyony (uso a
grafia de uma tradução para o inglês), seu capitão do exército russo, uma caricatura do mal.
Ele cerca Irina, a mais jovem,
com suas maneiras estranhas, sua
imposição ameaçadora e violenta.
O que se costuma ver é um Solyony que passa incômodo, mas
quase despercebido, até matar o
futuro marido de Irina -e selar o
destino de frustração das irmãs.
Mas Fernando Alves Pinto/Solyony começa a desenhar em cena.
Sem palavras, em vez de nada fazer, ele desenha comentários à peça, todos irônicos, alguns hilariantes. A sua voz descabida, entrando no meio dos diálogos, vai
acumulando nonsense.
E assim "As Três Irmãs" apresenta Tchecov como autor pleno
-sem se prender ao modelo do
tédio cotidiano, regra nas montagens. Isso se dá por opção da encenação de Bia Lessa, que foge da
alternativa fácil, melodramática.
Também por sua boa edição,
menos nos cortes e mais na definição de ritmo do espetáculo, em
que a ação alimenta os personagens e vice-versa -o que é inspirado, é flagrante, pela tradução de
Zé Celso, feita para ser falada,
com sabor nas palavras, cor nos
personagens.
Não é verdade que esta seja a
versão integral da peça. Há cortes
até demais, o que fragiliza alguns
personagens, como Andrei -ao
que parece, em troca de duração
menor. Mas este é o melhor, o
mais satisfatório espetáculo tchecoviano das últimas temporadas.
De maneira tão acentuada
quanto no personagem de Fernando Alves Pinto, a Natasha de
Ana Beatriz Nogueira surge outra:
é uma revelação o quanto a cunhada cruel, aproveitadora e algo
torturadora das três irmãs, carrega de humor. Não só: como contraponto às três irmãs, ela se agiganta aos poucos em sensualidade e poder, a ponto de vencê-las
inapelavelmente, no final.
Das irmãs, é desalentador ver
que Masha, precisamente aquela
que responde pelo motor de desejo de "As Três Irmãs", sai devendo, ainda uma vez. Deborah
Evelyn, no papel, está longe de demonstrar paixão por Vershinin
-ele também, aliás, apagado.
Renata Sorrah, já um pouco fora do personagem de Olga, a irmã
mais velha, mostra maior fervor
tanto na comédia como no drama, no final. Betty Goffman, a jovem Irina, é de um tempo cômico
invejável. Ela leva a peça com o talento das grandes comediantes:
salta com facilidade da farsa para
a tragédia, faz a primeira estimular a segunda, sem jamais se deixar derrubar por uma ou outra.
É, em tal qualidade, como uma
criança -o que acaba vestindo
com perfeição, e inesperadamente, a jovem e sacrificada Irina.
Tal salto, da comédia para a tragédia, não foi alcançado inteiramente pela montagem. Com o
texto completo, talvez se aprofundassem outros personagens e se
descobrisse também, atrás de seu
drama cotidiano, a tragédia.
Avaliação:
Peça: As Três Irmãs
Autor: Anton Tchecov
Direção: Bia Lessa
Com: Renata Sorrah, Deborah Evelyn,
Betty Goffman, Ana Beatriz Nogueira
Quando: qui a sáb, às 20h30; dom, às
18h
Onde: Teatro Popular do Sesi (av.
Paulista, 1.313, tel. 0/xx/11/284-3639)
Quanto: grátis (retirar o convite com
uma hora de antecedência)
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