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FERNANDO GABEIRA
Notas sobre uma semana punk
O único aspecto da imunidade parlamentar que defendo é o direito de expressar idéias
NO FUTURE. O slogan do movimento punk dominou esta
semana no Brasil. No domingo, os jornais anunciavam os
primeiros movimentos do escândalo da compra do dossiê contra Serra.
E a coluna de Elio Gaspari trazia a
informação de que o presidente Lula falou em fechar o Congresso. Sancho Pança dava um bom conselho a
Dom Quixote: olhe mestre, olhe
bem o que está falando.
Por falta de um Sancho Pança, Lula está se confrontando com moinhos de vento que jogam lama em
todas as direções.
Não precisa cortar a mão do Jader
Barbalho, como fazem alguns países
muçulmanos. Mas também não precisava beijá-las. Era possível classificar Suassuna de leal. Mas decente,
mestre? Comparar o Newton Cardoso com Pelé?
Tudo isso indicava já um futuro
difícil para a reconstrução do vínculo entre política e sociedade no Brasil. O escândalo do dossiê, coordenado pelo grupo de inteligência do PT,
rompeu uma das pontes estratégicas: a confiança entre adversários
para aprovação de projetos convergentes.
Já no meio do ano passado, o governo nos atendeu quando fizemos
uma reunião secreta com o general
Jorge Felix e pedimos a demissão de
um petista chamado Mexerica, que
estava alojado no Banco do Brasil
com a missão de bisbilhotar contas.
Foi uma operação discreta, graças
também ao desinteresse da mídia.
Agora, surge na campanha de Lula
um analista de risco que tinha a
mesma função no BB. Se deixou o
Banco para espionar em favor do
PT, quem garante que não o fizesse
dentro do próprio BB, para obter dados sobre a oposição?
Pessoalmente, isso não deveria
me interessar, pois minha no conta
no BB é de uma entediante monotonia. Mas e o sigilo bancário que deveria proteger a todos?
Estão todos preocupados com a
imagem de Lula. Sabia, não sabia,
bebeu, não bebeu. O caso do Banco
do Brasil é de mais longo alcance. É
uma instituição, depende da confiança do cliente. Ele não se se define, necessariamente, a partir dos
mesmos elementos de sedução da
política.
O grupo no governo parece não ter
a mínima idéia de como está minando o futuro, de como será difícil caminhar nessa terra devastada.
Neste momento, em que escrevo,
já sabem de tudo o que aconteceu.
Levarão dias para formular uma
versão corrigida, e os detalhes mais
escabrosos tentarão empurrar para
depois das eleições.
Como adversário, com uma visão
construtiva, o que é possível esperar? A última vez em que discuti
com o ministro Márcio Thomaz
Bastos, disse que preferia um advogado numa carreira reconhecida do
que um ministro sob suspeição. Ficou sentido. Agora está formalmente sob suspeição no TSE.
O único aspecto da imunidade
parlamentar que defendo é o direito
de expressar idéias. No entanto, estimulado por Lula, um dirigente de
sua campanha pede um processo
contra mim no Supremo. E o ministro Eros Grau acolheu a denúncia,
para escândalo dos juristas conscientes do Brasil.
Em outras palavras: ruiu, nesta semana, a ponte do entendimento.
Decidiram saquear e enfrentar o
país, baseados na sua maioria potencial de votos. Como diz a música:
quanto mais pesado vierem, mais
pesado sairão.
Nosso limite implica em rejeitar
atos ilegais e, firmemente, descartar
a violência. A partir daí, é reunir as
crianças e anunciar que vai começar
uma etapa na qual não somos mais
donos de nosso futuro.
Acho que eles não matam gente.
Há quem afirme o contrário, baseado no caso Celso Daniel. Mantenho,
apesar disso, minha posição de que
não ultrapassam esse limite.
Vão ameaçar com o povo na rua.
Dominam entidades, hoje alimentadas por verbas oficiais, e acreditam
que elas possam ser uma correia de
transmissão. O povo, às vezes, decide mandar para o ar burocratas e
suas organizações. A Hungria, por
exemplo, já começou a caça aos
mentirosos.
Embora não seja uma guerra, de
um ponto de vista formal muitos
elementos dela estão em jogo. Não
dá mais para conviver fraternalmente com cineastas que justificam
o mensalão, escritoras que propõem
a imoralidade e atores que atribuem
às "Mãos Sujas" de Sartre um sinal
verde para desviar dinheiro público.
Essas pessoas são cúmplices de
uma quadrilha que domina o governo brasileiro. São peixes do mar de
lama. Em vez de revidarem com a
sabedoria de Sancho Pança, empurram seus Quixotes para dias imprevisíveis.
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