São Paulo, domingo, 23 de novembro de 2008

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Academia analisa por que "Pantanal" é "atração fatal"

Reprisada após 18 anos, novela volta a ter bom ibope e prova que continua atual

Livro de Arlindo Machado (USP e PUC) e de Beatriz Becker (UFRJ) avalia a revolução que a trama impôs à teledramaturgia


LAURA MATTOS
DA REPORTAGEM LOCAL

"Atração Fatal". Ironicamente esse é o título do filme que a Globo exibia quando perdeu pela primeira vez da novela "Pantanal", da Manchete, em 31 de março de 1990.
Foi o começo de uma acirrada disputa de audiência, que impôs mudanças a todas as emissoras e revolucionou a linguagem da teledramaturgia.
Escrita por Benedito Ruy Barbosa e dirigida por Jayme Monjardim, a novela segue em reprise no SBT até janeiro próximo e, 18 anos depois, ainda consegue mobilizar telespectadores e embaralhar o Ibope.
Foi esse poder impressionante que seduziu dois doutores em comunicação, Arlindo Machado, professor da USP e PUC de São Paulo, e Beatriz Becker, professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Eles lançam amanhã, às 19h, na livraria Argumento do Leblon, no Rio, o livro "Pantanal - A Reinvenção da Telenovela" (Educ, 148 págs.), no qual buscam responder de que modo uma novela produzida por uma jovem emissora conseguiu enfrentar a supremacia da Globo e se tornar um dos maiores fenômenos da história da televisão brasileira.
"Pantanal" era um antigo projeto do autor. Ele não conseguiu emplacá-lo na Globo e decidiu se mudar para a Manchete, uma rede sem tradição na teledramaturgia, disposta a investir em uma programação mais ousada. A novela foi em grande parte gravada em uma fazenda pantaneira, fez da região seu tema e cenário principais, o que já foi uma grande inovação diante da hegemonia de novelas urbanas ambientadas no Rio.
Também ex-global, Monjardim pôde experimentar em "Pantanal" uma linguagem mais cinematográfica, com planos abertos, imagens aéreas das paisagens, cortes lentos e cenas longas, com tempo para o silêncio das personagens.
Os pesquisadores iniciam o livro lembrando que, quando "Pantanal" estreou, a Manchete tinha no horário 14 pontos de audiência e, inesperadamente, chegou a 44 no auge do sucesso.
Entrou no ar 11 dias depois que Fernando Collor confiscou a poupança dos brasileiros, e justamente esse momento histórico teria colaborado para alavancar a sua audiência.
""Pantanal" parecia prometer a devolução dos sonhos que Collor confiscou e as fantasias de um dia poder viver no paraíso, num lugar mágico, bonito, sensual, livre de toda a turbulência do mundo urbano, onde os homens poderiam existir em comunhão com a natureza", escrevem os pesquisadores.
Agora na reprise, sem Collor e em tempos de TV de alta definição, a velha novela dobrou a audiência do SBT no horário e chegou a bater a Globo. "Por coincidência, hoje temos também uma crise financeira e ainda precisamos reaprender a viver com outras referências que não só o dinheiro, o consumo, a poupança e a aposentadoria", afirma Machado à Folha.
Becker, que trabalhava como jornalista na Manchete em 1990 e fez várias reportagens sobre "Pantanal", complementa dizendo que a novela hoje, "diante da urbanização acelerada, do consumo e da fragmentação, funciona outra vez como resgate de identidades e valores que estão perdidos".
A discussão sobre a renovação da linguagem imposta por "Pantanal" à teledramaturgia e a aprovação do telespectador às novidades se torna especialmente relevante atualmente, quando as novelas estão com audiência abaixo das expectativas e a sobrevivência do formato volta a ser questionada. Para Machado, a novela só persistirá forte no Brasil "por inércia". "Falta um novo "Pantanal", um estouro, fenômeno inesperado. A telenovela se mostra um modelo datado e terá que ser reinventada, talvez com a interatividade, ou não conseguirá sobreviver. A TV brasileira está sem propostas criativas, de renovação, talvez porque as inteligências estejam indo para outros meios, como videogames."

Chaves e Chacrinha
"Pantanal - A Reinvenção da Telenovela" é parte de uma pesquisa mais ampla sobre programação de qualidade, que Machado iniciou com seu livro anterior, "A TV Levada a Sério", e seguirá em uma obra que deve ser lançada no próximo ano. "Sempre que falamos de televisão, há um pensamento negativista, mas a TV tem produção de alta qualidade. É só buscar o melhor, como fazemos com o cinema", diz Machado.
Outros programas estão em estudo, entre eles o do Chacrinha, a novela colombiana "Betty, a Feia" e o seriado mexicano "Chaves".


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