São Paulo, sábado, 23 de dezembro de 2006

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Livro reúne 60 anos de crítica de arte no país

Glória Ferreira lança "Crítica de Arte no Brasil: Temáticas Contemporâneas"

Com 91 textos de 80 autores, coletânea recupera sete questões fundamentais para o debate e análise da produção recente

GABRIELA LONGMAN
DA REPORTAGEM LOCAL

Publicados em jornais de época ou antigos catálogos, textos essenciais da história e da crítica de arte brasileira que permaneciam dispersos em arquivos e bibliotecas acabam de ser reunidos e publicados em livro. Com o propósito de consolidar um conjunto representativo da produção crítica das últimas seis décadas, Glória Ferreira, curadora e professora da Escola de Belas Artes/UFRJ, lança pela Funarte "Crítica de Arte no Brasil: Temáticas Contemporâneas". É uma preciosa coletânea de 91 textos de 80 autores que traz à tona as principais questões do universo da arte brasileira de 1946 à atualidade.
De Lorenzo Mammì a Ferreira Gullar, de Aracy Amaral a Lisette Lagnado, de Arlindo Machado a Paulo Sérgio Duarte, o mapeamento de autores e escritos deixa entrever as diferentes correntes da crítica que se formaram nessas décadas. A coletânea começa com "O Destino Funcional da Pintura" (1946), de Mário Pedrosa e chega até "Corpo e Vídeo em Tempo Real", texto de autoria de Christine Mello (2006).
Glória, que também publicou neste ano "Escritos de Artistas anos 60/70" (ed. Jorge Zahar, organizado juntamente com Cecilia Cotrim), diz que preferiu deixar de lado alguns ensaios mais conhecidos.
"Fiquei pensando como dar conta deste universo sem um compromisso burocrático", disse em entrevista à Folha. "Evitei a escolha de textos que fossem já muito difundidos. Não tinha sentido, por exemplo, publicar o manifesto neoconcreto e deixar de fora textos menos conhecidos sobre aquele contexto."
Embora as questões de cada texto possam ser vinculadas a momentos específicos da arte brasileira -o abstracionismo, os debates em torno do movimento concreto, a pintura gestual dos anos 80 e assim por diante-, os escritos não aparecem ordenados de maneira cronológica, mas agrupados em sete grandes núcleos ou problemáticas.
"Vários temas poderiam se desdobrar em vários outros, mas privilegiei a possibilidade de um debate em processo..."
Assim, neste verdadeiro trabalho de "arqueologia" de textos em arquivos, museus e bibliotecas -acompanhado por uma equipe de pesquisadoras- Glória encontrou os quase cem escritos que na sua opinião extrapolam em certa medida a discussão pontual e apontam para questões mais amplas em torno dos conceitos de vanguarda, tradição ou ruptura.
A escolha de Mário Pedrosa (1900-1981) para abrir o volume não é casual. Presente na compilação com seis textos (está em praticamente em todos os núcleos) Pedrosa é apontado por Glória como aquele que promoveu o deslocamento do debate do terreno ideológico para o estético-formal "em prol de linguagem universal de arte, não regionalista ou subordinada às tradições nacionais".

Crítica da crítica
Um dos núcleos mais interessantes vem trazer a própria crítica de arte para a arena de discussões. O livro deixa entrever, por exemplo, uma mudança na relação entre artistas e críticos no decorrer dos anos 60, no sentido de uma aproximação e até possível confusão entre os dois papéis.
"A curadoria não fica mais restrita ao curador", continua Glória. "É um território em que o próprio artista está cada vez mais presente."
Outro aspecto levantado pela pesquisadora refere-se aos espaços do debate crítico. Se os textos das décadas de 50 e 60 foram publicados sobretudo na imprensa, esse "eixo" se desloca para os catálogos e folders nas décadas subseqüentes.
Atualmente difusa, a produção recebe um pouco mais de espaço em publicações universitárias especializadas.

Atuais percursos
Revisitar a história da crítica nos conduz à inevitável pergunta: que momento é este em que, afinal, vivemos nós? "Tendo a achar que o debate vem se deslocando do campo da crítica para a própria exposição, por meio da curadoria, mas não só.
Em certa medida a exposição já se apresenta como um discurso em si, enquanto a crítica se transforma em algo mais ensaístico, mais teórico. Talvez este "ensaio" como forma seja justamente a constatação da crise do sistema."


CRÍTICA DE ARTE NO BRASIL
Autor:
Glória Ferreira (org.)
Editora: Funarte
Quanto: R$ 48 (580 págs.)


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