São Paulo, sábado, 23 de dezembro de 2006 |
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Crítica/estudo Obra discute engajamento intelectual independente
OSCAR PILAGALLO ESPECIAL PARA A FOLHA Há nos círculos do poder um lugar para o intelectual independente? A questão permeia "Intelectuais e Estado", livro que reúne textos de vários autores sobre experiências de escritores ligados a governos. O fascismo, de um lado, e o comunismo, de outro, são regimes em que a sobreposição das duas esferas foi desastrosa. A maioria das colaborações, no entanto, ocorre em ambientes menos opressivos, com resultados que só podem ser avaliados individualmente. Com escopo abrangente, abarcando os últimos dois séculos, os textos analisam as conseqüências do engajamento para intelectuais. Dois casos são particularmente interessantes, por permitir comparar a atuação pública de escritores associados a espectros políticos distintos: Graciliano Ramos, ligado ao Partido Comunista Brasileiro, e Ariano Suassuna, autor que já se definiu como um monarquista singular. Graciliano Ramos Graciliano Ramos (1892-1953), mesmo se declarando contra todos os governos sob os quais viveu, sempre trabalhou no serviço público, lembra Adriana Coelho Florent, professora da Universidade de Paris-8, Saint-Denis. Trata-se de exemplo corriqueiro na época de Getúlio Vargas, a ponto de Carlos Drummond de Andrade, ele próprio com um pé em cada barco, ter cunhado a expressão "escritor-funcionário". Para Florent, esse tipo de atitude, julgada com severidade por gerações posteriores, deve ser examinada à luz de dois critérios: os resultados obtidos em benefício do serviço público e a submissão da criação aos interesses do governo. O que torna ímpar o caso de Graciliano é o fato de, tendo também prestado serviços ao Partido Comunista Brasileiro, não hesitou em lhe fazer a crítica, ainda que intramuros, e enfrentou a determinação de Moscou de adotar a estética do realismo socialista. Segundo Adriana Coelho Florent, o escritor Graciliano Ramos "soube conservar sua lucidez tanto em relação ao poder getulista quanto aos arcaísmos do Comitê Central". Ariano Suassuna Quanto a Ariano Suassuna, foi criticado por ter aceitado o cargo de secretário da Educação e Cultura do Recife em 1975, servindo a um prefeito nomeado pela ditadura militar. Idelette dos Santos, professora da Universidade de Paris-10, Nanterre, não endossa a condenação. Ela se alinha com Hermilo Borba Filho (1917-1976), que, ao rejeitar a idéia de traição intelectual do companheiro, "proclama a abertura de um espaço de liberdade para a arte em Pernambuco, ainda que consciente da precariedade dessa abertura". A leitura cruzada dos textos publicados conduz à conclusão de que a integridade intelectual, indissociável da noção de independência, pode resistir a vínculos com governos. A questão é saber o que cada intelectual faz quando descobre o outro poder da caneta. Coletânea de textos apresentados num seminário internacional na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), "Intelectuais e Estado" sofre da desigualdade das obras do gênero, mas vale por confrontar argumentos para o debate ainda atual. OSCAR PILAGALLO é jornalista e autor de "A História do Brasil no Século 20" (em cinco volumes, pela Publifolha). INTELECTUAIS E ESTADO Organização: Marcelo Ridenti, Elide Rugai Bastos e Denis Rolland Editora: UFMG Quanto: R$ 47 (264 págs.) Texto Anterior: Musical: "O Fantasma da Ópera" estende temporada Próximo Texto: Ficção Índice |
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