|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
CINEMA
Roteirista David Newman fala em Miami sobre as críticas e a polêmica que cercou o uso de violência no filme
`Bonnie & Clyde', 30, ganha homenagem
EDIANA BALLERONI
especial para a Folha, em Miami
"Eles são jovens, eles se amam,
eles matam pessoas" dizia o anúncio em inglês do hoje clássico
``Bonnie & Clyde''.
O filme colocou muito sangue na
tela e usou a câmera intimista da
Nouvelle Vague para fazer o espectador se aproximar e amar aqueles
dois jovens que gostavam de aparecer nos jornais, tirar fotos e escrever poesia, mas que de vez em
quando matavam alguém.
``Bonnie & Clyde'' conta a real
história de Bonnie Parker e de
Clyde Barrow, dois jovens do Texas que aterrorizaram o meio-oeste dos EUA roubando bancos na
década de 30 -até serem mortos
em uma emboscada.
Eles roubavam bancos, mas não
os clientes; Bonnie escrevia poesias e Clyde amava sua parceira e
queria casar com ela, mas não conseguia fazê-la feliz na cama.
``Bonnie & Clyde'' foi taxado de
exaltador da violência, anticapitalista, antiestablishment. O sistema
financeiro, conta a lenda, pressionou contra a sua distribuição -temiam que virasse moda assaltar
bancos, como virou moda o figurino de Bonnie.
Lançado em 1967, o filme está
completando trinta anos e é um
marco na história do cinema. O
Festival de Miami fez uma homenagem especial, na semana passada, ao seu aniversário. Estavam
presentes o diretor Arthur Penn, a
atriz Estelle Parsons e o roteirista
David Newman, que deu a seguinte entrevista à Folha:
Folha - ``Bonnie & Clyde'' foi visto
como um filme antiestablisment. A
sua concepção teve a ver com o
ideário da contracultura?
David Newman - Bob (Robert
Benton, co-roteirista) e eu acreditávamos que muitos dos valores
do "underworld' (submundo) da
década de 20 haviam sido assimilados pelo "underground" da década de 60. ``Bonnie & Clyde'' poderiam ter feito parte da gangue de
Andy Warhol ou vice-versa. Eles
dividiam o desejo comum de se
tornarem celebridades.
Folha - O lançamento foi cercado
de muita polêmica...
Newman - No começo defendíamos a violência e a sua necessidade no filme, depois nos cansamos e paramos. Aí vieram as teorias: era uma metáfora sobre a
guerra do Vietnã, contra a brutalidade na América, pelo desarmamento etc. Houve uma jornalista
que escreveu uma teoria sobre o
significado do vidro quebrado no
filme. Era interessante, mas não
houve nada intencional no vidro
quebrado. Aquilo era um filme sobre gângsteres.
Folha - Aquele foi o seu primeiro
roteiro. De onde saiu a idéia?
Newman - Bob e eu trabalhávamos na revista ``Esquire''. Ele era
diretor de arte, eu era editor. Começamos a escrever juntos, a fazer
matérias juntos, a ir ao cinema
juntos. A redação ficava ao lado do
MoMA, que tem um departamento de filme fantástico e vivia exibindo Fellini, Antonioni, Bergman, Truffaut e Godard. Nós também fazíamos freelance juntos. Tínhamos uma coluna sobre o ponto
de vista masculino na revista
``Mademoiselle''. Aí começamos a
escrever sobre comportamento na
``Esquire''.
Parece simples falar sobre os
anos 60 hoje, mas na época, quando estávamos vivenciando o momento, não era. As matérias tiveram tanta repercussão que virou
uma coluna. Tivemos, então, a
idéia para ``Bonnie & Clyde''. Eles
eram pessoas do ano 60 vivendo
nos anos 30. Era assim que víamos
a história deles.
Folha - Quando o filme foi lançado, a crítica européia o recebeu
melhor do que a americana...
Newman - O ``New York Times'' tinha um crítico de cinema
há quase 30 anos que foi assistir o
filme no Festival de Montreal e escreveu uma crítica insultante, afirmando que o filme era uma apologia da violência, uma exaltação do
crime, etc. Ele não entendeu nada.
O filme estreou nos EUA e começou a ser elogiado. A ``Newsweek''
também publicou uma crítica negativa. Uma semana depois -eu
nunca tinha visto isso- o mesmo
crítico se "retratou". Ele disse
que os seus amigos insistiram tanto que ele estava errado, que ele resolveu ver o filme novamente. E tinha achado genial.
Finalmente, o ``The New Yorker'' publicou um ensaio de 40 páginas sobre o filme. Positivo. Foi
fantástico. Na Europa, a crítica recebeu muito bem e o público
aguardava ansiosamente o lançamento. Foi sucesso em todos os lugares. As mulheres passaram a
usar a "moda Bonnie". A música
de banjo começou a ser tocada. Virou mania.
Folha - O filme foi elogiado pela
precisão histórica. Todos os fatos
são reais?
Newman - Sim, exceto um deles. Inventamos a tatuagem em
C.W. (um dos membros da gangue, interpretado por Michael Pollard, cujo pai arma com a polícia a
emboscada para Bonnie e Clyde).
O pai de C.W. podia entender que
o filho era um ladrão e um assassino, mas não podia aceitar que ele
fosse diferente, que ele tivesse uma
tatuagem no peito, porque Bonnie
gostava. A estória da tatuagem reforça a idéia que queríamos passar
de que a sociedade não sabe lidar
com quem é diferente.
Folha - O que veio depois de
``Bonnie & Clyde''?
Newman - Benton e eu continuamos trabalhando juntos por
vários anos. Fizemos ``There Was
a Crooked Man'', ``What's Up,
Doc?'', ``Bad Company'', ``Oh!
Calcutta!'' e outros. Depois ele foi
dirigir filmes, e eu fui escrever.
Na década de 80, escrevi a trilogia de ``Superman'' com minha
mulher, Leslie. Às vezes também
escrevo com meu filho, Nathan.
Escrevi o filme "Santa Claus", em
que trabalhou Dudley Moore, e
"Moonwalker", para Michael
Jackson. Também fiz um de que
não me orgulho muito, "Sheena".
Folha - Quais são os seus projetos atuais?
Newman - Estou escrevendo
com minha mulher o roteiro de
"Takedown", um filme baseado
na história real de como o especialista em computadores Shimamura pegou um "racker" que o Pentágono e o FBI perseguiam há muito tempo.
Vou começar os ensaios da peça
"The Life", um musical que escrevi sobre a vida das prostitutas
da região de Times Square na década de 80, que estréia na Broadway em abril. Também acabo de
escrever "Men's Lives", que terá
música de Billy Joel e será estrelado por Alec Baldwin, e fala da vida
dos pescadores do lado leste de
Long Island.
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
|