|
Texto Anterior | Próximo Texto | Índice
MÚSICA/LANÇAMENTOS
"FRANTIC"
Pela primeira vez, artista volta ao som original de sua ex-banda
Bryan Ferry alegoriza o Roxy Music em novo CD solo
DA REPORTAGEM LOCAL
Um passeio rasante pelos
agridoces tempos de sua primeira banda, Roxy Music, é o que
o inglês Bryan Ferry, 56, se propõe
a fazer em seu novo disco solo,
"Frantic".
Parece banal, mas agora é necessário lembrar: ele nunca fizera
isso, desde pelo menos o encerramento definitivo (em 1982) da
banda que mais enxertou arte e
glamour no pop e no rock.
"Frantic", que em junho Ferry
exibirá ao vivo em São Paulo (dias
18 e 19) e no Rio (22 e 23), é resultado de breve turnê de reunião do
Roxy Music, no ano passado.
Aparentemente foi a partir dali
que mister sutileza consolidou,
para concluir "Frantic", o abandono da estética lo-fi que tem
orientado sua carreira solo. Em
troca, volta ao rock'n'roll classudo e estiloso que caracterizou sua
produção em banda, principalmente no período 1972-75.
Nas faixas (muito Roxy Music)
"A Fool for Love", "Goddess of
Love" e "San Simeon" está de volta o baterista original do grupo,
Paul Thompson, com quem Ferry
não trabalhava havia 20 anos.
Acima de tudo, "I Thought", o
galante tema de vampiro que encerra o CD, é a primeira composição em parceria entre Ferry e
Brian Eno, a outra figura crucial
na formulação dos conceitos
Roxy. Em 73, Eno deixou a banda
brigando com Ferry após dois
discos, e não haviam mais produzido juntos. Além de co-autor, ele
está nos teclados e nos vocais de
fundo da arrepiante "I Thought".
Tais reencontros não significam
mera perfumaria, como é tão comum. Mesmo sem convidados
"históricos", Ferry tentou mergulhar fundo nos ingredientes originais da fórmula de art rock de sua
velha banda.
É por isso que "Frantic" começa
com uma versão surpreendente,
hiper-roqueira, da antes chorosa
"It's All Over Now, Baby Blue"
(65), de seu ídolo Bob Dylan. A
abertura é de alto impacto, causa
medo de que o pique caia logo em
seguida.
Não cai. "Cruel", de Ferry com
Dave Stewart (dos Eurythmics), é
densa e acelerada na busca da reprodução das melhores características kitsch-chique do Roxy
Music -um rolo compressor
passando sobre dores do passado,
do presente e do futuro.
"Goddess of Love", a seguir, é a
faixa que mais retrocede no tempo, evocando Marilyn Monroe,
Jackie O, Greta Garbo e James
Bond para tentar reelaborar o
tempo frenético de "Virginia
Plain" (72) e outras obras-primas.
"Hiroshima...", inspirada pelo
filme "Hiroshima Mon Amour" e
contando com a presença de
Jonny Greenwood, guitarrista do
Radiohead, estabelece clima dos
mais pesados, sem medo de assustar o ouvinte -e essa é outra
das definições de art rock.
Mas nada, no CD, se iguala a "A
Fool for Love", que tem por introdução um excerto tipo "Avalon"
(o derradeiro LP do Roxy, de 82),
de tema medieval composto por
Ricardo Coração de Leão (!).
No romantismo entre utópico e
melancólico de "A Fool for Love",
Ferry sublima a síntese entre o
lorde glam que liderava o Roxy
Music e o senhor sisudo que conduz carreira solo de intérprete sob
a mais macia e manhosa das vozes. Olha para o passado, com
mais rigor e êxtase que passadismo saudosita.
O resultado releva uma trajetória que vinha cambaleante, alternando flashes de gênio (como em
"Taxi", 93, todo feito de covers) e
discos de medianos a ruins ("Mamouna", 94, ou "As Time Goes
by", 99, também de covers). Focado e concentrado, Ferry corta no
pop sua incisão mais precisa em
muitos e muitos anos.
E "Frantic", é hora de dizer agora, apenas tenta reencenar as glórias do Roxy Music -não consegue, nem deveria. Que coisa.
(PEDRO ALEXANDRE SANCHES)
Frantic
Artista: Bryan Ferry
Lançamento: Virgin/EMI
Quanto: R$ 25, em média
Texto Anterior: Teatro: O fenômeno "Cócegas" Próximo Texto: Outros Lançamentos: Archive Índice
|