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Crítica/entrevistas
"Novíssimos" apresentam angústia da filosofia pós-68
LUIZ FELIPE PONDÉ
ESPECIAL PARA A FOLHA
A filosofia é uma disciplina com múltiplas vocações: a universidade, o
cemitério, o mosteiro, o mercado. Quando fica restrita a um
desses espaços, sai perdendo,
ou em consistência, ou em profundidade, ou em sutileza.
Sabe-se que a filosofia "está
na moda" nos jantares chiques,
mas isso, a priori, não precisa
ser visto como uma traição à filosofia, porque mesmo a universidade a trai o tempo todo
em nome da burocracia da objetividade.
O livro de Sébastien Charles
"Comte-Sponville, Conche,
Ferry, Lipovetsky, Onfray, Rosset - É Possível Viver o que Eles
Pensam?" (título lamentável),
da Barcarolla, é uma boa opção
para quem quiser entrar em
contato com alguns dos filósofos franceses em atividade depois da derrocada das "fórmulas" que abraçavam ou o marxismo, ou a psicanálise, ou o
existencialismo como modos
de redenção (pós)moderna em
meio aos escombros de Deus. O
autor consegue apresentar e
entrevistar esses autores de
modo consistente e claro, virtude necessária para uma filosofia que quer transitar entre o
claustro e o mundo.
A maioria dos autores contemplados é conhecida da
grande mídia, talvez com exceção de Clément Rosset (um trágico alegre à la Nietzsche) e
Marcel Conche (um helenista
materialista). Trata-se de filosofias que, ainda que diferentes
nos problemas que discutem e
nas "soluções" que apontam,
superaram Maio de 68 e suas
manias de que somos todos
alienados para além de qualquer possibilidade de cura (ainda que a temática da cura permaneça assombrando a todos).
Outra característica comum
seria uma preocupação com a
recusa do estilo hermético dos
estruturalismos marxistas desconstrucionistas. Nossos "novíssimos filósofos" escrevem e
falam para muitas pessoas e
não apenas para os "imortais".
Há em todos uma tendência
para uma filosofia da finitude e
seus desdobramentos típicos,
como angústia, hedonismo,
materialismo, liberdade absurda, revolta ou simples aceitação
da crueldade (beleza?) do real.
Pessoalmente não concordo
com a identificação de Lipovetsky como um tocquevilliano: ainda que o indivíduo seja
"celebrado" em Tocqueville como função antidespotismo da
maioria, não me parece que o
aristocrata francês "celebre"
tanto o nascente mundo do individualismo materialista como o sociólogo antiidealista de
Grenoble parece "celebrar";
pelo contrário, Tocqueville
aponta o materialismo como
um risco da democracia, ao lado de sua tendência para a mediocridade prática. Da ecologia
à política, da ética à sexualidade, o foco é a (in)felicidade e
suas práticas, numa vida que
deve ser re-significada a cada
café da manhã.
LUIZ FELIPE PONDÉ é professor do departamento de teologia da PUC-SP e da Faap e autor
de "Conhecimento na Desgraça" (Edusp)
COMTE-SPONVILLE, CONCHE, FERRY, LIPOVETSKY, ONFRAY, ROSSET - É POSSÍVEL VIVER O
QUE ELES PENSAM?
Autor: Sébastien Charles
Tradução: Maria Lucia Machado
Editora: Barcarolla
Quanto: R$ 38 (220 págs.)
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