São Paulo, domingo, 24 de agosto de 2008

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Livro reúne 25 horas de entrevistas com Cobain

Além do vocalista do Nirvana, biografia que chega ao Brasil traz cerca de 60 fontes

Jornalista e escritor norte-americano Michael Azerrad freqüentava a casa de Cobain um ano antes de seu suicídio, em 1994

THIAGO NEY
DA REPORTAGEM LOCAL

O adjetivo definitivo é talvez o mais usado para classificar uma biografia bem produzida. Quando o tema é Kurt Cobain, um trabalho que pode ser considerado definitivo é "Mais Pesado que o Céu", extensa pesquisa de Charles R. Cross já lançada no Brasil. Agora, as livrarias do país recebem, finalmente, uma obra definitiva sobre a banda que lançou o vocalista ao estrelato.
"A História do Nirvana -°Come As You Are" (ed. Madras; 368 págs.; R$ 49,90) é o resultado de 25 horas de entrevistas que Michael Azerrad fez com Cobain, entre 1992 e 1993. O jornalista e escritor norte-americano conversou ainda com os outros integrantes da banda (Krist Novoselic, baixista; Dave Grohl, baterista), parentes, amigos e gente da indústria.
O livro foi lançado nos EUA no final de 1993 -Cobain cometeu suicídio em abril de 1994, e o Nirvana, uma das mais influentes bandas da últimas duas décadas, deixou de existir. Durante a realização da biografia, Azerrad esteve muito próximo de Cobain. Freqüentava a casa do músico, e as conversas varavam madrugadas. Conseguiu arrancar do vocalista detalhes de sua infância e adolescência até então desconhecidos do público (problemas familiares, depressão).
Além do lançamento do livro, Azerrad vem ao Brasil. Ele participa do debate "O Que É Underground na Era do MySpace?", evento que faz parte do festival Orloff5, que acontece em São Paulo entre 1º e 6 de setembro. O debate acontece na Fnac Paulista (av. Paulista, 901, SP; tel. 0/xx/ 11/2123-2000; entrada gratuita), às 19h, e terá, além de Azerrad, o norte-americano Buzz Osbourne (do grupo Melvins). A seguir, a entrevista que Azerrad concedeu à Folha.

 

FOLHA - Seu livro sobre o Nirvana foi publicado antes da morte de Kurt Cobain. Depois, saíram várias obras sobre ele e a banda. Nesse cenário, por que seu livro ainda é relevante?
MICHAEL AZERRAD -
É o único que inclui entrevistas com os membros da banda, e enquanto o Nirvana ainda existia. Falávamos sobre coisas que estavam acontecendo naquele momento. Algo que nenhum outro livro sobre o Nirvana possui.

FOLHA - Há alguns críticos que afirmam que o sr. não se aprofundou em alguns temas, como os problemas de Cobain com a heroína...
AZERRAD -
Completei [o livro] em junho de 1993. Foi publicado em novembro de 1993. Muitas coisas dramáticas aconteceram após a conclusão do livro. O problema dele [com a heroína] ainda não era tão grave. Quando o livro foi publicado, alguns meses haviam passado, e eu não poderia prever o futuro. Sou um bom escritor, mas não consigo prever o futuro...

FOLHA - Teve alguém que não quis conceder entrevistas ao sr.?
AZERRAD -
Uma vez que sabiam que Kurt, Krist e Dave haviam concordado, todos que procurei não se recusaram. Foram 50 ou 60 pessoas. O único que não quis foi Calvin Johnson [da banda Beat Happening e dono do selo K Records]. Estava incomodado com o hype em cima do Nirvana, não quis participar.

FOLHA - Por que o sr. se interessou pelo Nirvana? Como foram seus primeiros contatos com a banda?
AZERRAD -
Ouvi "Bleach" [disco de estréia do Nirvana, de 1989] e achei OK, mas nada que fosse durar dez anos. Quando "Nevermind" saiu [em 1991], aquilo capturou o momento que vivíamos. Essas coisas não acontecem a toda hora. Meu primeiro contato foi quando fiz uma capa para a "Rolling Stone", em 1992. Entrevistei Kurt para a matéria. Ele e Courtney viviam temporariamente perto de Los Angeles. Fui ao apartamento, e Courtney atendeu. Ela foi muito gentil, me ofereceu uvas, salgadinhos. Me levou a um quarto, onde Kurt estava deitado.
Os pés escapavam do cobertor, e suas unhas estavam pintadas de vermelho. Ele me disse para sentar ali, e fiz a entrevista.

FOLHA - A que o sr. atribui o enorme sucesso do Nirvana?
AZERRAD -
Na época [final dos 80/começo dos 90] vivíamos sob música pop muito ruim, com bandas chatas de heavy metal. Estávamos cansados daquilo. Ao mesmo tempo, muita gente passou a prestar atenção ao que ocorria no underground americano, em bandas como Black Flag, Pixies, Replacements, que faziam música boa e ganhavam popularidade. O Nirvana buscou influência em várias dessas bandas e fez boa música melódica. E tinham um vocalista muito bonito.

FOLHA - Sobre a morte de Cobain, muita gente afirma que ele estava descontente com a fama e a atenção que ele recebia. Mas quando o Nirvana começou, Cobain buscava o reconhecimento e a fama, não?
AZERRAD -
Sim, ele queria ser bem-sucedido. Mas depois passou a rejeitar aquilo. Mas esse conflito não foi o que o levou ao suicídio. Ele sofria de uma depressão crônica que nunca tratou. Sentia dores estomacais violentas havia anos. Então colocar alguma coisa ou outra como motivo [para o suicídio] não é focar no problema todo. Seria como romantizar sua morte.

FOLHA - O Nirvana aconteceu antes da internet. Se a banda começasse hoje, faria o mesmo sucesso?
AZERRAD -
O público fragmentou-se com a internet. Não temos uma banda com apelo tão grande como o Nirvana. Talvez o Radiohead, mas o público deles é mais específico. Talvez seja impossível aparecer uma banda de rock como Nirvana.


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