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CRÍTICA
Filme não cola como sátira à elite nacional
CRÍTICO DA FOLHA
"Os Normais - O Filme" é
uma boa prova: o sistema
de produção da Globo goza de
plena saúde. Já que os tempos são
de pragmatismo, não custa admitir: a irresistível (e mais que previsível) ascensão da Globo Filmes
no mercado cinematográfico brasileiro funcionou como um anabolizante para o cinema da retomada. Não fosse ela, dificilmente
este teria alcançado os alardeados
25% do mercado interno.
Porcentagem que se deve não
apenas aos contundentes "planos
de mídia" que a Rede Globo reservou aos seus produtos e aos de
seus parceiros. A Globo, há tempos porta-voz da nacionalidade,
trouxe para o mercado cinematográfico seu know-how na mercantilização dos temas e valores
nacionais, servindo de (segunda)
escola até para medalhões do cinema brasileiro que há muito
ameaçavam adaptar seu vago
ideário nacional-popular ao puro
pragmatismo mercadológico.
Para o bem e para o mal, o cinema e a tevê nacionais estão selando um casamento duradouro.
Bem-sucedidos produtos televisivos ganham os cinemas e vice-versa. Bem-sucedidos profissionais de tevê migram para o cinema e vice-versa. E é inevitável que
se torne mais híbrida também a
relação entre as linguagens televisiva e cinematográfica.
A tevê oferece parte de seu público como dote e ganha, em contrapartida, certa legitimidade.
Não há dúvida de que a Globo soma, com o casamento, maior legitimidade à pretensão de encarnar
a identidade nacional.
Consolidando sua hegemonia
no mercado brasileiro, a Globo
Filmes se afirma como uma alternativa imediata para a tão aguardada consolidação da indústria
cinematográfica brasileira. Essa
espécie de Hollywood tupiniquim
em que vem se projetando faz-se
um tanto evidente e auto-celebrativa nesta adaptação para o cinema da série "Os Normais".
Filme de estúdio concebido como paródia das comédias românticas americanas e parido como
uma espécie de "screwball comedy" ("comédia maluca") dos
anos 30/40, dado o ritmo irrefreável e a pretensa excentricidade
dos diálogos, a informalidade e o
perfeito entrosamento dos atores,
"Os Normais - O Filme" é uma
realização coletiva que demonstra
certa excelência de produção.
Não se pode negar que o filme
seja o bem-sucedido produto de
uma dinâmica de trabalho estabelecida ao longo da série. O que se
questiona é a telessociologia global. Como bom produto, "Os
Normais" tem seu público-alvo:
apesar de caricaturas como a personagem de Marisa Orth, Martha,
que vive preocupada com seu patrimônio e gosta de fazer apostas
em dólar, o filme não cola como
sátira à elite nacional.
No material de divulgação, o diretor José Alvarenga Jr. ressalta a
verve meio "sacana" da série. Ele
poderia ter dito "politicamente
incorreta" sem prejuízo de causa,
o que ainda seria um tremendo
eufemismo. Tenderíamos a pôr
no lugar uma série de "ismos": sexismo (desbragado), materialismo (conformado), arrivismo (ligeiro) e darwinismo social explícito (seus personagens mal disfarçam seus preconceitos de classe).
Reconhecemos aí alguns atributos intransferíveis de nossa elite
com os quais "Os Normais" é um
pouco mais do que condescendente.
(TIAGO MATA MACHADO)
Os Normais - O Filme
Produção: Brasil, 2003
Direção: José Alvarenga Jr.
Com: Luiz Fernando Guimarães,
Fernanda Torres
Quando: a partir de hoje nos cines
Bristol, Ibirapuera e circuito
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