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Crítica/"Roberto Carlos e Caetano Veloso - E a Música de Tom Jobim"
Caetano e Roberto fazem karaokê de luxo em disco frio
Show dos músicos em homenagem a Tom Jobim sai em CD e DVD sem ousadia
ANDRÉ BARCINSKI
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Aconteceu. Tom Jobim
(1927-1994) virou santo. A consagração aconteceu em dois shows no Auditório Ibirapuera, em agosto, e foi
sacramentada agora, com o lançamento do CD ao vivo "Roberto Carlos e Caetano Veloso - E a
Música de Tom Jobim".
Tudo no disco é devoto. A começar pela capa, que mais lembra um CD evangélico: emoldurados por um quadro azul-celeste, Roberto e Caetano aparecem de blazer azul, olhando um
para o outro e aplaudindo.
Diante de tamanha fé e devoção, é impossível não lembrar
dos Skrotinhos de Angeli, perseguindo João Gilberto pelas
ruas: "Olha lá o João... João soltou pum! João é gênio!". O alvo
da piada, claro, não era o compositor, mas o oba-oba frenético que costuma acompanhá-lo.
Quando foi anunciado que
Caetano e Roberto fariam
shows e gravariam um disco em
homenagem a Tom Jobim, a
curiosidade foi grande. Quem
mais, senão esses dois, teria
moral e cacife para mexer na
obra do compositor e fazer algo
diferente do que nos acostumamos a ouvir?
A ousadia, infelizmente, não
deu as caras. Optou-se pela reverência absoluta. O disco, que
tinha tudo para ser um marco,
virou um karaokê de luxo, com
dois monstros da música brasileira cantando clássicos da bossa nova em versões quase idênticas às originais. Como se a
obra de Tom Jobim e a bossa
nova estivessem num pedestal,
sagradas e intocáveis.
Desperdício
O CD é bonito e agradável,
mas isso é pouco em face da expectativa criada. Afinal, só com
muito mau gosto alguém conseguiria estragar "Wave" ou
"Insensatez" (deve haver, em
algum YouTube por aí, uma
versão axé para "Águas de Março" ou "Corcovado").
O que frustra no CD de Roberto e Caetano é a oportunidade desperdiçada. Porque eles
entraram com o jogo ganho. Dividindo um disco inteiro pela
primeira vez, com um repertório desses -"Inútil Paisagem",
"O que Tinha de Ser", "Lígia"-
era de se esperar uma gravação
emocionante e arrebatadora.
Mas o resultado é exatamente o oposto: um CD desanimado, com interpretações burocráticas e nada, mas nada mesmo, que não tenha sido requentado dezenas de vezes em
shows e especiais de TV.
Nem em "Chega de Saudade", o óbvio encerramento
do show, a dupla demonstra
grande emoção. É tudo protocolar e frio.
No fim das contas, parece um
disco preguiçoso. Os arranjos
são preguiçosos, e até o encarte
é banal. Será que o mundo precisa de mais um encarte com a
letra de "Garota de Ipanema"?
Seria difícil incluir depoimentos dos dois sobre a bossa nova
e a obra de Tom? Caetano não
teria histórias curiosas para
contar sobre Jobim? Não seria
interessante saber de Roberto
por que, 50 anos depois, ainda
nos interessamos por patos,
banquinhos e violões?
Não é à toa que o CD sai bem
na véspera do Natal. As versões
bem-comportadas e caretas de
Roberto e Caetano para as músicas de Tom Jobim são a trilha
sonora ideal para o almoço de
família e o "amigo secreto" da
firma (ou "amigo oculto", se você mora no Rio de Jobim e da
bossa nova).
ROBERTO CARLOS E CAETANO VELOSO - E A MÚSICA DE TOM JOBIM
Gravadora: Sony BMG
Quanto: R$ 32 (CD) e R$ 42 (DVD; classificação: livre)
Avaliação: regular
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