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Tony Ramos vibra em silêncio com o sucesso
Ator diz que comemora êxitos sem alarde, o que vale até para "o hexa do São Paulo'
Em cartaz na TV e no cinema, ele diz que "a representação está em não complicar" e assegura que o alardeado "colapso da novela" não virá
SILVANA ARANTES
DA REPORTAGEM LOCAL
Nesta altura de sua carreira,
iniciada aos 14 anos de idade, o
ator Tony Ramos, 60, está seguro de que o público ouve até o
que ele diz só para si mesmo.
Um exemplo está no longa-metragem "Se Eu Fosse Você
2", de Daniel Filho, um sucesso
que está nos números de bilheteria (aproxima-se dos 4 milhões de espectadores) e nas rodas de conversa pelo país.
Outro dia, a caminho de um
restaurante, no Rio de Janeiro,
onde vive, Ramos ouviu "do
frentista do posto, do guardador de carros, do porteiro e do
maître" comentários elogiosos
à cena em que seu personagem,
Cláudio, discute os termos do
divórcio da mulher (Glória Pires) diante de um advogado.
O que se ouve no filme é
Cláudio repetindo, em tom sussurrado, a lista dos bens que o
advogado sugere ficar com a ex.
Os espectadores, contudo, captaram a revolta colérica que toma conta dele. O truque, diz
Ramos, está em seu "texto interior", em ter imaginado "um
grande palavrão, sem dizê-lo",
no fato de que "por dentro, a cabeça era quase um vulcão".
Como os adeptos da tese de
que "menos é mais", Ramos diz
que "a representação está em
não complicar", o que significa
que, "além de entender, compreender e decorar, é preciso
saber que você não é aquele
personagem e brincar com ele".
Viver o personagem, não!
Ramos é, portanto, um tipo
de ator avesso ao trânsito aparentemente esquizofrênico dos
que "entram" e "saem" constantemente de seus personagens. "Não consigo viver o personagem. Não há a menor possibilidade de eu levar um personagem para a minha casa!"
O que fez Tony Ramos, ou
melhor, Antônio Carvalho Barbosa Ramos querer ser ator foram os ídolos que ele via nas
matinês de cinema, quando garoto. "Eu queria ser Oscarito
[1906-70] e Totò [1898-1967]."
Nascido na Espanha, Oscarito chegou ao Brasil aos dois
anos de idade e fez história no
cinema nacional, como astro da
Atlântida. É considerado por
muitos críticos o maior comediante que o país já teve.
O italiano Totò é, na opinião
do crítico da Folha Inácio
Araujo, "o grande comediante
do pós-guerra; ele fazia na chave da comédia o que o neo-realismo fazia como drama".
Porém, não é exatamente à
comédia que a carreira de Ramos é mais comumente associada pelo público, mas sim ao
estereótipo do galã de novela.
Até aqui, são 72 personagens
desempenhados na TV, numa
trajetória iniciada em 1964,
quando Ramos despontou no
programa de Ribeiro Filho
"Novos em Foco" (Tupi) e ali
chamou a atenção do diretor
Cassiano Gabus Mendes.
Na recém-estreada novela
das oito da TV Globo, "Caminho das Índias", Ramos interpreta o sisudo Opash, um conservador patriarca indiano, que
procura manter a família fiel às
tradições mais ortodoxas.
Respeito ao folhetim
O ator estava na Alemanha,
em julho passado, quando a autora Glória Perez lhe telefonou,
com o convite para participar
da novela. Mesmo de férias,
após as filmagens de "Se Eu
Fosse Você 2", ele se dispôs a
ouvi-la, porque considera "Glória Perez uma autora que respeita o folhetim".
E Tony Ramos é alguém que
há muito tempo aprendeu a
respeitar quem respeita o folhetim. "Quando a gente dizia:
"Isso só acontece em novela!",
dona Janete respondia: "Cuidado, que a novela busca [suas
tramas] na vida", conta ele.
Papisa da escrita melodramática para a TV, Janete Clair
(1925-1983) e Ramos tinham
uma relação amistosa o bastante para que ele a tratasse sem a
formalidade do "dona".
Mas ele prefere manter a forma mais respeitosa. "Às vezes
tenho esse tom com ela e com
dona Ivani Ribeiro [1916-1995].
É uma questão de homenageá-las. São grandes autoras. São
clássicas. São inesquecíveis."
Nu na TV
Foi numa novela de "dona
Janete", "O Astro", que Ramos
fez seu primeiro nu na teledramaturgia, que ele calcula ter sido também o primeiro nu masculino da TV brasileira.
"Era 1977. Havia censura.
Mas dona Janete conseguiu
convencê-los de que era importante", recorda. A cena mostrava o rompimento de um filho,
Márcio Hayala (Ramos), com o
pai, Salomão Hayala (Dionísio
Azevedo). "Eu dizia: "De você,
nem o dinheiro que comprou
essa roupa eu quero mais". Tirava a roupa e saía", conta o ator.
Quem o dirigiu? Daniel Filho.
Desde então, só fez crescer a
confiança do ator no diretor.
Ramos diz que faz "qualquer
projeto proposto pelo Daniel",
cujo talento ele julga insuficientemente reconhecido no
Brasil. "Lá fora, as pessoas
veem esse filme e comentam:
"What a timing!". O tempo de
comédia do Daniel é genial."
De estrangeiros e de compatriotas, Ramos ouve "desde os
anos 70" previsões sobre "o colapso da novela". Mas ele é categórico na avaliação contrária:
"A novela continuará".
Para Ramos, "a discussão
sempre é sobre como fazer para
manter o espectador interessado". E a resposta, para ele, não
muda nem falha: "texto, texto e
texto" e a obediência ao tripé
"amor, paixão e suspense".
Um recurso que pode se tornar mais comum, avalia o ator,
é o da inversão de expectativas
do público, como foi a escalação
de Patricia Pillar no papel de vilã e de Cláudia Raia como a sofredora na trama de "A Favorita" (João Emanuel Carneiro),
que antecedeu o folhetim "Caminho das Índias".
"Esse tal do sucesso"
Convidado a responder se
também concordaria em "desconstruir" sua imagem de "mocinho" na TV, Ramos responde:
"Já fiz isso muitas vezes!".
Sem pausar a fala, ele cita
cinco personagens (confira
quadro à dir.) nos quais explorou facetas mais complexas e/
ou sombrias da alma humana e
acrescenta o Cláudio, de "Se Eu
Fosse Você 2", que passa pela
experiência de ser uma mulher
no corpo de um homem.
Mocinho ou vilão, Ramos habituou-se a ter uma carreira
que se mantém em evidência
há décadas. "A vida já me deu
muita coisa. Eu me sinto muito
recompensado por esse tal do
sucesso", afirma.
Desse "tal do sucesso", assim
como de "dona Janete", ele
mantém distância respeitosa.
"O que o sucesso dá é mais conforto para escolher novos projetos. É muito bom a gente comemorá-lo, silenciosamente. É
uma característica minha. Sou
muito feliz com o hexa do meu
São Paulo, mas não saio por aí
gritando, "Que venha o hepta!'".
Colaborou LAURA MATTOS, da Reportagem Local
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