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Crítica/"O Veredicto"
Com mestres da interpretação, Lumet constrói filme sobre justiça do conchavo
CÁSSIO STARLING CARLOS
CRÍTICO DA FOLHA
Quando aparecem na
ficção, os tribunais parecem, muito mais que
lugar de julgamentos, grandes
peças de teatro em que se encenam decisões cruciais que podem tanto dar direito à liberdade quanto apressar a hora da
morte. Por causa desse tudo ou
nada movido a falas e reviravoltas vários graus acima da banalidade, os personagens nos filmes judiciais costumam ser
disputados a tapa por grandes
atores, conscientes de seu poder de atração.
Em "O Veredicto", produção
de 1982 que ganhou uma bela
edição em DVD, o duelo entre a
acusação e a defesa se realiza
no confronto entre dois mestres da interpretação, James
Mason e Paul Newman, cujos
desempenhos receberam indicações ao Oscar (sem levar).
Entre os dois pólos circula a
enigmática Laura Fischer, a
que Charlotte Rampling empresta sua estranha beleza.
Por trás da cena já ocupada
por grandes nomes encontra-se ainda outro, Sidney Lumet,
diretor que sabe não roubar para si os principais interesses de
seus filmes.
Com uma regular trajetória
como diretor de seriados de TV,
Lumet estreou como cineasta
em 1957, justamente num filme
de tribunal, o insuperável "Doze Homens e Uma Sentença".
A fase mais conhecida de sua
carreira está associada a policiais como "Serpico", "Um Dia
de Cão" e "O Príncipe da Cidade", nos quais a justiça é posta à
prova por meio de personagens
dispostos a enfrentar poderes
que barram o acesso aos ideais.
O que interessa a Lumet em
todos esses dramas não é o crime, mas o lado de dentro da lei
e o quanto a justiça depende de
acertos e conchavos, o que
compromete nossas concepções de verdadeiro e falso.
"O Veredicto" reapresenta a
questão por meio da figura de
Frank Galvin, um advogado de
porta de cadeia, antes profissional de brilho e agora caído
em desgraça. A certa altura somos informados que sua queda
foi provocada pela recusa em
não participar de esquemas ilícitos conduzidos pelo sogro.
Para complicar as coisas, esse
herói decaído adotou o álcool
como companheiro fiel.
Sua derradeira chance de recuperação pessoal e profissional aparece no caso de um erro
médico que deixou uma jovem
em coma. Frank vai se aferrar a
ele com as artimanhas indispensáveis à profissão, e Lumet
se recusa a nos desenhar o personagem com as tintas falseadoras da pureza.
Essa obsessão que leva o homem comum à margem é recorrente nos filmes de Lumet e
também nas histórias de David
Mamet, aqui em seu segundo
trabalho para o cinema e já autor de um habilidoso roteiro.
Lumet, contudo, evita as pistas falsas comuns de Mamet e
não brinca de esconder muita
coisa do espectador. Seu jogo às
claras denota outra intenção:
exibir a justiça como uma construção, uma articulação entre
forças em que poder financeiro,
relacionamentos com cargos-chave e capacidade retórica
produzem resultados que não
necessariamente têm a ver com
inocência ou culpa.
Em meio a tudo isso, seu herói pode até encontrar o caminho da redenção, mas não escapa de perder a inocência antes
de alcançá-la.
O VEREDICTO
Lançamento: Fox
Quanto: R$ 30, em média
Classificação: não indicado a menores de 12 anos
Avaliação: ótimo
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