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Super-heróis no divã
"Watchmen", série americana dos anos 80 que mudou o conceito da HQ, retorna ao Brasil e vai ao cinema
ALEXANDRE MATIAS
FREE-LANCE PARA A FOLHA
12 de outubro de 1985. Nada
perturba a noite de Nova York a
não ser o ruído dos dirigíveis elétricos. Um barulho de vidro quebrando interrompe o silêncio, seguido de um estampido seco. Na
calçada, o corpo do agente Edward Morgan Blake, 61, está deitado na mancha de sangue causada
por seu impacto. Da janela quebrada, alguém deu início à última
etapa de uma conspiração que
terminaria em menos de um mês.
Estamos de volta ao universo de
"Watchmen", o marco central da
HQ moderna, que consagrou seus
autores -Alan Moore e Dave
Gibbons- e dividiu a história
dos quadrinhos em duas partes. A
série volta a ser publicada no Brasil às vésperas do início da produção de sua versão cinematográfica, programada para estrear em
2005. Originalmente uma minissérie em 12 edições, a nova versão,
que será lançada em março pela
Via Lettera, desta vez vem dividida em três volumes, preservando
as capas de todos os originais.
A volta de "Watchmen" também coincide com a continuidade
da publicação das obras da editora ABC, de propriedade de Moore
no Brasil, pela editora Devir. Depois do primeiro volume da "Liga
Extraordinária", a editora promete mais séries.
Lançada em 1987, "Watchmen"
foi o primeiro épico que Moore
concebeu após ser contratado pela editora americana DC Comics.
Depois de exibir seu talento com
as séries "A Balada de Halo Jones"
e "V de Vingança", o autor foi para os EUA trabalhar com o
"Monstro do Pântano" -virou o
personagem do avesso e deu-lhe
contornos dramáticos. Quando se
dispôs a escrever "Watchmen",
Moore queria fazer o mesmo, mas
em grande escala.
Tensão política
"Quando surgiu a oportunidade
de fazer histórias maiores que
duas ou três edições de uma revista de 24 páginas, era a chance de
imaginar estruturas", disse Moore à revista "Locus". "Para
"Watchmen", uma minissérie de
12 edições parecia ser um tamanho razoavelmente popular."
A intenção inicial era rever o
conceito de super-herói a partir
de uma visão mais realista e sombrio. Era o auge da era Reagan-Thatcher e Moore queria capturar, numa HQ, a tensão da época.
Para isso, idealizou um mundo
em que super-heróis pudessem
existir -não apenas num aspecto
físico, mas principalmente psicológico. Moore perguntava o que
levava um sujeito a vestir-se numa fantasia e sair caçando bandidos. Nada de justiça, vingança ou
vontade de ajudar as pessoas -os
motivos listados incluíam trauma, vício, ganância e psicose.
Trabalhando a partir de heróis
de um antigo selo da DC (a Charlton), Moore logo os reformulou,
transformando-os em seus próprios personagens, como o filósofo dr. Manhattan, o vigilante
Rorscharch, Ozymandias -"o
homem mais inteligente do mundo"- e o amoral Comediante.
Ao lado de "Cavaleiro das Trevas", de Frank Miller, "Watchmen" foi responsável por ampliar
o espectro psicológico dos personagens, à procura de uma face ao
mesmo tempo sombria e humana
dos super-heróis. Mas Moore e
Gibbons foram ainda além com
seus experimentos de narrativa.
Dividindo quase todas as páginas
em nove quadrinhos idênticos, os
dois puderam trabalhar com luz,
montagem, cores e alternância de
narrativas de forma exemplar.
Texto e imagens criam uma história com roteiro multifragmentado, em que todas as partes se juntam de forma aterradora no fim.
O desfecho é uma das grandes
preocupações dos fãs da série em
relação à sua adaptação cinematográfica. A cena que abre o último capítulo da série é especialmente delicada nestes dias de
Doutrina Bush, e é muito provável que ela será refeita. Esta é uma
das poucas certezas em relação à
adaptação da série para a telona.
O roteiro foi escrito por David
Hayter -o mesmo de "X-Men" e
"Hulk"-, que quer estrear na direção com "Watchmen" (os bastidores de Hollywood dizem que
Hayter ficará na vontade). Afinal,
esse projeto já esteve nas mãos de
nomes como Terry Gillian (que
escreveu um roteiro para um filme de seis horas) e o produtor
Joel Silver ("Matrix"). As filmagens devem começar ainda neste
ano em Praga, mesmo que o elenco ainda não esteja definido. Entre as especulações, fala-se em
John Cusack e Sigourney Weaver.
Só uma coisa é certa: os irmãos
Wachowski, de "Matrix" não irão
dirigi-lo. Eles estão de olho em
outro projeto de Moore: "V de
Vingança".
WATCHMEN. Autor: Alan Moore.
Editora: Via Lettera. Quanto: a definir
(lançamento previsto para março).
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