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"Não dizíamos que fazíamos teatro"
ARTICULISTA DA FOLHA
Desde 1974, Hamilton Vaz Pereira, 52, escreve, encena, atua e
produz espetáculos teatrais. Nunca remontou um. No ano passado, ao entrar numa livraria, folheou peças e não encontrou o seu
nome.
"Escrevi 20 textos, todos montados. Senti-me egoísta ao não presentear os leitores com a minha
obra, e assim procurei uma editora. Hoje, aguardo o momento em
que o leitor vai entrar numa loja,
colocar o meu livro no colo e deixar que a vida mova-se ao seu redor", afirma.
O autor publica os textos criados com e para o Asdrúbal Trouxe o Trombone: "Trate-me Leão",
"Aquela Coisa Toda" e "A Farra
da Terra".
(MRP)
Folha - Por que você apresenta o
Asdrúbal Trouxe o Trombone como
comediantes?
Hamilton Vaz Pereira - Equipe de
comediantes, era assim que a gente se chamava. Nossa turma não
se sentia "de atores", não dizia
que fazia teatro e sim que fazia
"Asdrúbal". Provavelmente, para
marcar uma certa diferença dos
grupos importantes da época, e
dos atores de mercado que faziam
em cena o que a oportunidade
profissional lhes oferecia. Estávamos mais para Oscarito do que
para Sérgio Cardoso.
Folha - Era intenção de vocês discutir o fazer teatral com "Trate-me
Leão"?
Pereira - Era. Muito embora
mais importante era fazer teatro
da maneira que a gente achava
que devia ser feito. Se isso discutisse a produção teatral da época,
melhor ainda. O palco é um lugar
para o exercício das singularidades.
Folha - Vocês tinham idéia da relevância da peça, tanto do tema
quanto do formato?
Pereira - Durante os nove meses
de criação, tive tempo para criar
cenas, ensaiá-las com atores, conviver com os parceiros e pensar
que aquele processo de criação
nos levaria a um espetáculo inédito. Estávamos trabalhando duro e
tão apaixonadamente que tudo
deveria ter uma relevância para
além da trupe.
Folha - Pensam em montá-la de
novo?
Pereira - Tenho o projeto de
montar pelo menos um espetáculo do Asdrúbal para registrá-lo
em DVD. No ano passado, quase
conseguimos patrocinador, mas
não rolou. Os comediantes estão
todos aí, fortes, bonitos, saudáveis, em atividade e encantando
seu público.
Folha - Vocês foram patrulhados,
já que havia um clima de arte engajada no ar?
Pereira - De todas as patrulhas, o
que mais me chocava era ouvir da
geração anterior, repleta de atores, diretores e dramaturgos excepcionais, que teatro não vale
nada, não leva a nada, não muda
nada. Lembro que quando estreamos "Trate-me Leão" um crítico
adorou o espetáculo, mas sentiu
falta de "um verdadeiro autor
dramático". Pois bem, anos depois, aquela geração que assistiu
ao espetáculo e as que vieram depois vão poder ler o texto integral
e verificar se ele fluiu com o tempo, se ele ainda tem a ver com a vida, se ele ainda merece ser encenado.
Folha - Tiveram problemas com
censura ou polícia?
Pereira - Naquela época, eu não
fazia alarde dos problemas que a
gente tinha com a censura, com
jornalistas-patrulheiros, com as
autoridades da repressão policial.
Mas a verdade é que passamos
por prisões, por censuras, por diversos constrangimentos pelos
quais não gostaria que nossos filhos passassem.
TRATE-ME LEÃO. Autor: Hamilton Vaz
Pereira. Editora: Objetiva. Quanto: R$
33,90 (184 págs.).
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