São Paulo, sábado, 25 de março de 2000


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ACADEMIA
O geógrafo e ambientalista paulista recebeu anteontem o título da Universidade de São Paulo
Ab'Saber vira emérito ao som de Chico

IRINEU FRANCO PERPETUO
especial para a Folha

Teve forte cunho político a cerimônia em que o geógrafo e ambientalista paulista Aziz Ab'Saber recebeu o título de professor emérito da Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas (FFLCH) da USP, anteontem à tarde, no salão nobre da FFLCH.
Aposentado desde 1982, o professor honorário do IEA (Instituto de Estudos Avançados) da USP defendeu um "socialismo democrático e humano" para uma platéia formada por convidados ilustres, como o intelectual Antonio Candido e o presidente de honra do Partido dos Trabalhadores, Luiz Inácio Lula da Silva.
Autor do livro "Amazônia: Da Teoria à Práxis" (Edusp), ganhador do Prêmio Jabuti em 97, e um dos presidentes de honra da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), Ab'Saber foi definido pelo reitor da universidade, Jacques Marcovitch, como o "geomorfologista brasileiro mais respeitado em todo mundo".
No ano passado, conquistou, na categoria Ciências da Terra, o Prêmio Almirante Álvaro Alberto para Ciência e Tecnologia, concedido pelo Ministério de Ciência e Tecnologia, no valor de US$ 30 mil.
Pró-reitor de Cultura e Extensão Universitária da USP e professor titular do departamento de geografia, Adilson Avansi de Abreu destacou o papel de Ab'Saber na mudança dos paradigmas científicos de apoio da geomorfologia, bem como o pioneirismo em novas metodologias, como o uso de fotografias aéreas.
Abreu lembrou ainda a passagem do vencedor do Prêmio Moinho Santista em 98 pelo Condephaat (Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Artístico, Arqueológico e Turístico do Estado de São Paulo), à frente do qual teve forte participação no tombamento de regiões naturais.
Ab'Saber entrou na sala ao som de "Levantados do Chão", canção de Chico Buarque e Milton Nascimento. As paredes do prédio estavam decoradas com "Movimento dos Sem-Terra", exposição do fotógrafo Sebastião Salgado.
"Não me presto muito a homenagens, porque sou um chorão", afirmou, passando em seguida a defender a universidade pública, "não por causa corporativa, mas por causa de consciência".
Lembrando com carinho antigos mestres, como Roger Bastide, Ab'Saber disse que seu interesse inicial era ser historiador e que teria desistido não apenas devido às difíceis condições econômicas do período (Segunda Guerra Mundial), mas também por gostar das excursões de campo propiciadas pelo estudo da geografia.
Em um discurso forte e emocionado, não poupou as privatizações ("não valeram nada, pois seus recursos não foram utilizados para a dinamização econômica e cultural da sociedade brasileira"), a globalização ("que destrói e desindustrializa, é uma colonização de enquadramento financeiro e econômico") e as elites do Terceiro Mundo ("são ruins, especialmente nesta cidade e neste Estado, pois nunca se preocuparam com os problemas do país, com a desigualdade social").
Disse, contudo, não ser político, nem ligado a partidos: "O cientista tem de estar longe dos problemas partidários, étnicos e religiosos".
No trecho mais aplaudido, criticou a metodologia de medição de preços da Fipe (Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas), cujos índices "não combinam com o que eu verifico como comprador de supermercado e de feira".
Ab'Saber aproveitou para defender a transformação do Código Florestal em um código de biodiversidade, porque "o Brasil não é só floresta". Tal código deveria merecer um gerenciamento particular, longe da "incompetência, frieza e insensibilidade da burocracia de Brasília".


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