São Paulo, segunda-feira, 25 de março de 2002

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"MÃE CORAGEM E SEUS FILHOS"

Espetáculo é despojado e divertido sem cair no deboche

SERGIO SALVIA COELHO
ENVIADO ESPECIAL A CURITIBA

Dizia Brecht : o teatro deve divertir. A afirmação parece um contra-senso vinda do grande mentor do teatro político, que se propõe instrumento de análise das injustiças do mundo. Mas Brecht buscava se precaver contra o tédio das peças sentenciosas, do dogma ensinado às massas, por meio de uma irreverência estratégica para deixar o público à vontade. O importante em seu teatro é instigar, não converter.
O diretor Sérgio Ferrara soube fazer uma "Mãe Coragem e Seus Filhos" divertida e tocante, sem querer grandes achados, sem roubar focos de um grande elenco, mas sem deixá-lo descambar para o deboche.
Chega assim a uma fábula livre de referências históricas, bastando as legendas projetadas para situar o público. O mesmo despojamento está presente nos cenários de Serrone, cortinas que abrem e fecham quando morrem os filhos, que eficazmente contribuem para a dinâmica do espetáculo, sugerindo um melodrama de teatro ambulante sem cair no miserabilismo naturalista.
Cúmplices em uma mesma fé no taco, o elenco reveza a ribalta abrindo a voz e se expondo ao público. Pertencem, no entanto, a etapas diversas da carreira. Há a geração dos que se lançam agora, sem se intimidar com o falso respeito de "fazer Brecht" para melhor trilhar as sutilezas da partitura, aprendendo a ganhar os calos da estrada. A ela pertence Jiddú Neves, com tipo físico e inteligência ideais para fazer a filha muda de "Mãe Coragem". Há a geração que colhe os louros da carreira: José Rubens Chachá põe o público no bolso na primeira cena e só o solta para passá-lo para Chirolli, Caribé ou Mariana Muniz. E há a terceira etapa, privilégio de poucos, como Maria Alice Vergueiro.
Maria Alice não faz teatro: ela é teatro. Basta a ela estar no palco, falar com voz serena, e ficamos cúmplices de "Mãe Coragem", com todas as suas contradições à mostra. Fluem generosos a dor e o deboche, a sensualidade e o maquiavelismo. E, quando é preciso cantar, solta a voz com uma agilidade que coloca cacos nas partituras mais difíceis. "Mãe Coragem" é um momento histórico do teatro brasileiro.


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