São Paulo, segunda, 25 de maio de 1998

Texto Anterior | Índice

LANÇAMENTO
Obra de Oliveira retoma lições de 68

INÁCIO ARAUJO
Crítico de Cinema

"Louco por Cinema" foi o tipo do filme deslocado nesse "renascimento" do cinema brasileiro: personalíssimo, dava-se ao luxo de incluir todas as idiossincrasias de André Luiz Oliveira, seu diretor, em detrimento do tempo, da norma ou do gosto público.
É compreensível que tenha sido um fracasso. O cinema brasileiro atual busca se reafirmar entrando pela porta de serviço, aparentando aquela humildade e bons modos próprios dos bons empregados, aqueles que sabem o seu lugar.
Não que isso seja errado. Talvez não exista mesmo alternativa. "Louco por Cinema" talvez fosse de fato um arcaísmo, uma emanação tardia de 68.

O livro
"Louco por Cinema", o livro que se lança hoje no Rio e amanhã em São Paulo, mais do que ajudar a compreender o processo de criação do filme, coloca em relevo algumas questões muito atuais.
Começando pelo começo: a idéia inicial era publicar apenas o roteiro do filme. Concebeu-se uma introdução.
Aos poucos, ela tornou-se uma autobiografia reduzida; o livro, uma simbiose do cinema com a vida -que é também o que é o próprio filme.
Pois "Louco por Cinema" não é um desses títulos blasés que buscam tirar partido de um amor -o mais das vezes narcisista- pelo cinema. É a história de um diretor recolhido a horas tantas a um sanatório.
Exatamente o que aconteceu com André Luiz Oliveira no começo dos anos 70, uma história que começou quando foi preso pelo simples fato de estar sem documentos e com os cabelos compridos. Condenado a um ano de detenção, terminou cumprindo pena em um manicômio judiciário.
Se o caso é central -pois dele surge a idéia do filme-, é apenas um entre os muitos episódios que nos levam da Bahia à Índia e do Guarujá a Brasília. Pois "Louco por Cinema" é uma história de andanças, de derivas. Do cinema, passa-se à música, mas a música já inclui a poesia, pois o show "Mensagem" era uma adaptação de poemas de Fernando Pessoa.
Hoje se chamaria a isso multimídia. Não é o caso. O rótulo tem algo de mercadológico, de classificatório. Exclui a paixão, a vontade de uma alma de se manifestar -e é isso que move o trabalho de André Luiz Oliveira.
Música, cinema, literatura são uma coisa só. Trechos de um corpo marcado pela arte da paixão. Seria injusto dizer que "Louco por Cinema", o livro ou o filme, colocam em questão nosso cinema e nossa literatura contemporâneos. Eles se dirigem, eles atingem a caretice do presente como uma lição de suave resistência contra o tempo da vida pré-fabricada.
Talvez não haja muitas escolhas -como no caso do cinema. Mas a lição está dada por esse livro de exceção.

O quê: lançamento do livro "Louco por Cinema" Quando: hoje no Rio e amanhã em SP, sempre às 20h30 Onde: Espaço Unibanco de Cinema (no Rio, r. Voluntários da Pátria, 35; em SP, r. Augusta, 1.470) Lançamento: 30º Festival de Brasília do Cinema Brasileiro Quanto: não definido ( 234 págs.)



Texto Anterior | Índice


Copyright Empresa Folha da Manhã S/A. Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução do conteúdo desta página em qualquer meio de comunicação, eletrônico ou impresso, sem autorização escrita da Agência Folha.