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Crítica/"Pecados de Guerra" e "Johnny Vai à Guerra"
Dramas de guerra mostram americano como vítima e algoz
JOSÉ GERALDO COUTO
COLUNISTA DA FOLHA
Toda obra de arte, mesmo quando ambientada
no passado ou no futuro, fala de alguma maneira sobre a sua época. Não é diferente
com os filmes de guerra. Dois
títulos que agora chegam ao
DVD comprovam isso.
Em "Johnny Vai à Guerra",
de 1971, único filme dirigido pelo escritor e roteirista Dalton
Trumbo, o entrecho diz respeito a um rapaz norte-americano
(Timothy Bottoms) que volta
mutilado, cego, surdo e mudo
do front da Primeira Guerra.
Mas o foco de Trumbo -um
dos profissionais perseguidos
como comunistas durante a
"caça à bruxas" dos anos 50- é,
evidentemente, a Guerra do
Vietnã, que sacrificava milhares de jovens americanos na
época em que o filme foi feito.
"Johnny Vai à Guerra" tornou-se um clássico pacifista ao
mostrar com uma crueldade
próxima do humor negro um
rapaz pleno de vida e sonhos
que se transforma de repente
num homem-tronco, num pedaço de carne mantido vivo artificialmente para ser alvo de estudo.
As cenas do presente narrativo são filmadas em austero preto-e-branco, quase em alto contraste. Ouvimos em "off" a
consciência de Johnny, lutando a duras penas para distinguir o que é realidade e o que é
pesadelo ou delírio induzido
pelas drogas.
Suas lembranças e, sobretudo. suas alucinações são apresentadas num colorido artificial, em tom alegórico que se
coaduna com um certo psicodelismo da contracultura da
época. Vemos, por exemplo,
Donald Sutherland como uma
espécie de Cristo hippie jogando pôquer com os recrutas que
vão para o front.
Esses artifícios, que realçavam a atualidade do filme em
sua época, hoje o tornam um
tanto datado, embora potente.
Situação oposta é a de "Pecados de Guerra", que parece ter
até rejuvenescido. Baseado em
fatos reais ocorridos nos anos
60 e realizado 15 anos depois do
fim da desastrosa intervenção
dos EUA no Vietnã, o longa-metragem de 1988 trazia à tona
o sentimento mais profundo
com que os americanos tinham
que lidar: a culpa.
A história é conhecida: numa
patrulha na selva, um pequeno
destacamento rapta, estupra e
mata uma garota vietnamita.
Um dos soldados, o novato
Eriksson (vivido por Michael J.
Fox), se recusa a participar da
ação e entra em choque com
seu superior, o sargento Meserve (Sean Penn).
Virtuosismo visual
Fugindo um pouco de seu cínico ceticismo habitual, De Palma faz dessa situação um tenso
drama moral, com direito a epifania redentora no final, ao som
de Ennio Morricone.
Algumas seqüências, como a
do túnel por onde os vietcongues parecem se mover num gigantesco formigueiro, atestam
que o virtuosismo visual do diretor está presente, só que controlado de modo a servir à narrativa, e não o contrário, como
às vezes acontece em sua obra.
Nos extras, um "making of" e
uma entrevista de Michael J.
Fox reconstituem de modo
exemplar o apuro e os percalços da produção, enriquecendo
a fruição do filme. E acabamos
convencidos de que De Palma,
além de um enorme talento,
também tem um coração.
JOHNNY VAI À GUERRA
Direção: Dalton Trumbo
Produção: EUA, 1971
Distribuidora: Aurora; R$ 30
PECADOS DE GUERRA
Direção: Brian de Palma
Produção: EUA, 1988
Distribuidora: Sony; R$ 35
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