São Paulo, Sexta-feira, 25 de Junho de 1999
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"EPISÓDIO 1", EU NÃO GOSTEI
Gélido e previsível, "A Ameaça Fantasma" vende e entedia

AMIR LABAKI
da Equipe de Articulistas


Primeiro, desconfie de títulos longos e pomposos, como "Star Wars: Episódio 1 - A Ameaça Fantasma". Segundo, confie em seus instintos. A possibilidade de mais três (talvez seis!) episódios de "Guerra nas Estrelas" sempre soou caça-níqueis. Terceiro: duvide de cineastas que não gostam de filmar. Hitchcock foi a exceção; George Lucas, de volta atrás das câmeras após 22 anos, é a regra.
Não surpreende, portanto, que "A Ameaça Fantasma" seja de longe o mais tedioso filme da série. Espanta, sim, que a decepção tenha sido muito maior do que se poderia imaginar.
Nem por um instante revisita-se o poder de catarse e de maravilhamento da aventura original. A Força definhou e, quando ressurge no novo filme, tem o automatismo das citações para alegrar fãs. Nada restou do espírito das matinês, tal a previsibilidade da trama e a flacidez com que nos é apresentada.
Para quem andou em outras galáxias no último ano, "A Ameaça Fantasma" é o primeiro capítulo da saga intergaláctica que tem por "Guerra nas Estrelas" (1977) o episódio quarto, "O Império Contra-Ataca" (1980), o quinto, e "O Retorno de Jedi" (1983), o sexto.
O sempre universal conflito de impostos catalisa o choque entre a despótica Federação Comercial e o pequeno planeta Naboo. O mal e o bem, para ir direto ao ponto na rasa filosofia lucasiana.
O vilão é um senador canalha, Palpatine (Ian McDiarmid), que jura apoio ao planeta ao mesmo tempo que conspira contra sua autonomia. A mocinha é a rainha de Naboo, Amidála (Natalie Portman), que parece mais inconfortável dentro do guarda-roupa retrô-oriental de Trisha Biggar do que ao confrontar o inimigo.
Para defender-se, Amidála conta com dois cavaleiros jedi, o mestre Qui-Gon Jinn (Liam Neeson) e o aprendiz Obi-Wan Kenobi (Ewan McGregor hoje, Alec Guinness ontem), logo reforçados pelo "gungan" Jar Jar, um réptil antropomorfizado de pretenso poder cômico. Já Palpatine conta com tropas infindáveis, mas fia-se mesmo numa espécie de anti-jedi, chifrudo e de cara vermelha com motivos pretos: é Darth, claro, Maul.
Não, não esqueci de Anakin Skywalker (Jake Lloyd), por mais que o garoto esteja neste filme mais para justificar as próximas continuações. Anakin, o mundo sabe, será o futuro Darth Vader, embora Lucas reserve para os dois próximos episódios os passos que o farão mudar de lado. Desta vez, parece-lhe o bastante tingi-lo com tintas cristãs como filho de uma imaculada concepção, anunciá-lo como candidato a jedi e ocupá-lo numa corrida à "Ben-Hur" e numa batalha espacial.
As escolhas de elenco e o burocratismo das interpretações são a maior prova de que Lucas dedicou-se muito menos à concepção e à encenação desta trama básica do que ao desenvolvimento de sua moldura "high tech".
Restaria a pirotecnia dos efeitos da Industrial Light and Magic, mais de 2.000, quatro vezes mais do que em "Titanic". É muita indústria e luz para nenhuma magia.
Diante do computador, aqui sim infatigáveis, Lucas e turma procuraram de fato ocupar esmeradamente cada espaço de quadro com seres e veículos nunca antes imaginados. Tela após tela tem inegável plasticidade, mas a interação dramática é mínima e o acúmulo, contraproducente. Ao fim, habitat e fauna virtuais resultam absolutamente esquecíveis.
Se assim é, como explicar tamanho sucesso? Primeiro: não confunda triunfo de marketing com vitória cinematográfica. "A Ameaça Fantasma" contava com um público potencial que já elevara a quase US$ 2 bilhões a arrecadação da série. Não se tratava de um produto fílmico difícil de vender.
Em segundo lugar, parece-me fundamental o efeito feira de ciência. Há uma imensa audiência mobilizada pela tão cantada "revolução tecnológica" dos efeitos. É o chamariz da hora.
Por último, para o público-alvo mais evidente, a garotada, "A Ameaça Fantasma" não é um mero filme, uma experiência cinematográfica emocionante como a de "Guerra nas Estrelas" há duas décadas atrás. Na era da indústria do entretenimento controlada pelas grandes corporações, é sobretudo um mega-anúncio do selo "Star Wars", responsável pela apresentação dos novos produtos no mercado bilionário de jogos e brinquedos. Para tanto, que "A Ameaça Fantasma" seja gélido como um videogame não importa tanto assim.


Avaliação:  


Filme: Star Wars: A Ameaça Fantasma -Episódio 1
Direção: George Lucas
Onde: cines Marabá, SP Market 3 e circuito



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