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Músico vê "imbecilização" da indústria cultural
Flo Menezes, que conheceu Stockhausen, diz que o novo é "inesgotável"
Crítico de Villa-Lobos, o músico que já compôs para a Osesp lança livros teóricos
em defesa da radicalidade criativa e do "novo"
JOSÉ ORENSTEIN
COLABORAÇÃO PARA A FOLHA
Ele faz música eletrônica e
eletroacústica, mas não é DJ
nem seguidor de Gilberto Gil.
Longe disso. Como diz o próprio compositor paulistano Flo
Menezes, parafraseando o cantor popular, "cada macaco no
seu galho". E a sua árvore, no
caso, finca raízes num outro
terreno: o da música erudita experimental.
Aos 47 anos, ele acaba de relançar a coletânea de ensaios
"Música Eletroacústica - Histórias e Estéticas" (Edusp, R$ 98),
traduziu artigos do compositor
e seu professor Henri Pousseur, "A Apoteose de Rameau"
(Edunesp, R$ 84) e se diz "cada
vez mais intolerante com a música" - do passado ou do presente.
O termo eletroacústico a que
ele se refere no livro tem como
marco inicial os experimentos
musicais realizados paralelamente na França e na Alemanha a partir das décadas de 50 e
60, quando elementos sonoros
eram gravados ou sintetizados
e então trabalhados e reproduzidos em novo tecido musical.
E se desde o berço esteve
propenso à radicalidade e à experimentação (seu pai, Florivaldo Menezes, de quem herdou o nome, era poeta ligado ao
concretismo paulista), sua filiação artística é também muito
clara: aqueles mesmos europeus que impulsionaram a vanguarda no século passado e com
alguns dos quais chegou a ter
contato, como Stockhausen,
Boulez, Berio e Pousseur.
Sem concessões
Enquanto a música eletrônica de apelo popular começava a
embalar pistas em todo o mundo na década de 80, Flo Menezes estudava composição na
USP com Willy Corrêa, para depois seguir para a Alemanha.
Mas ele logo avisa, "a música
dos DJ's não tem nada a ver
com o que faço. A única coisa
comum é o uso da eletricidade
gerando sons. São opostas".
O compositor diz só ouvir
"música popular quando é forçado". E diz estar perplexo com
a atual "a agudização do processo de imbecilização do que
Adorno caracterizou muito
bem como indústria cultural".
Na sua busca pela obra de arte complexa, ele despreza soluções híbridas, que misturam
erudito e popular e "lhe causam
arrepios", e rejeita a música de
inspiração regional ou nacionalista. Até Villa-Lobos entra na
sua mira. "Um cara que tem
300 obras, das quais 8 são muito interessantes, e o resto você
pode espremer e jogar no lixo
-é complicado você dizer que é
um deus da música."
O tonalismo por sua vez, se
ainda é por vezes a trilha sonora de seu carro no trânsito paulistano rumo à Unesp (Universidade Estadual Paulista)-onde é professor e chefe do departamento de música-, "não faz
sentido senão como referência" para seu trabalho diuturno
de compositor.
Mas não seria essa sua música radical um tanto hermética?
Flo Menezes não titubeia:
"chamar de hermetismo é uma
visão limitada do grau de profundidade que se atinge com a
radicalidade dessa arte". E
prossegue: "Meus concertos
são cada vez mais respeitados e
causam arrebatamento cada
vez mais geral. Isso por uma absoluta falta de concessão nos
níveis estético e técnico. Não
admito o precário".
Em 2007, a Osesp executou a
primeira audição mundial dos
24 minutos de "Crase", peça
composta especialmente por
Menezes. Mas, apesar de considerar a Osesp um exemplo,
"um marco absolutamente fundamental" (e lamentar a saída
de John Neschling), Menezes
reclama do pouco espaço dado
no Brasil aos contemporâneos.
"Há no país uma concepção
muito careta da parte do músico com relação a musica contemporânea. Ele tem medo do
novo." A busca do novo, afinal,
é o que norteia Flo Menezes e o
coloca na vanguarda, que, para
ele, "não morreu, porque vanguarda é estar na frente impulsionando a pesquisa, transgredindo, inovando".
Menezes diz compor "para a
posteridade" e estar "contribuindo para uma mudança de
página na música brasileira".
Ao se expor a riscos e erros, diz
que pretende "apontar caminhos interessantes que fujam
da música de mercado". Na direção do Studio Panaroma na
Unesp (nome inspirado em
"Finnegan's Wake" de James
Joyce) ele forma novas gerações de músicos que procuram
o percurso experimental.
No pelotão de frente da criação e da especulação na música
-que classifica como "matemática dos afetos"-, Menezes
não dá sinais de cansaço. "O novo é inesgotável. O que é esgotável é o velho. Só é preciso ter o
pique para achar: ter o pique da
invenção."
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