São Paulo, sábado, 25 de setembro de 2004

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PERSONALIDADE

França comemora no dia 20 de outubro os 150 anos de nascimento do escritor, autor de "Iluminações"

Com distanciamento, Rimbaud transcende épocas

PATRICK KÉCHICHIAN
DO "MONDE"

Para celebrar o 150º aniversário do nascimento de Arthur Rimbaud, Pierre Brunel, especialista em sua sobra, organizou uma edição comentada de "Iluminações". Magra, admirável e misteriosa, a obra de Rimbaud é freqüentemente recoberta por uma extraordinária fortuna mitológica. Poucos escritores se beneficiaram, ou padeceram, de tal tratamento póstumo.
Pierre Brunel é autor de diversos ensaios, bem como edições críticas de "Uma Temporada no Inferno" (ed. José Corti, 1987) e, recentemente, "Iluminações" (José Corti, 764 págs., 28). Com a aproximação do 150º aniversário (20/10), Brunel falou sobre a figura de Rimbaud.
 

Pergunta - As imagens que se fixaram à figura de Rimbaud, gênio precoce, revoltado absoluto, místico, terminaram por afetar a leitura que fazemos de sua obra?
Pierre Brunel -
Talvez o mito tenha terminado por encobrir Rimbaud, e, em vez de gastar energia tentando remover essas máscaras, seria melhor estudá-lo com o rigor que seus textos exigem e sem perder de vista sua intensidade e o fervor que eles inspiram. Sou menos sensível à evocação dos dias finais de sua vida, tão terríveis, em "Les Jours Fragiles" [Os dias frágeis], de Philippe Besson, não importa o talento demonstrado pelo autor, do que à eclosão da poesia de Rimbaud e sua constante renovação.

Pergunta - O sr. é responsável por edições críticas das obras de Rimbaud. Essa ciência dos textos é indispensável?
Brunel -
O trabalho filológico nos textos, fáceis ou difíceis, foi conduzido nos últimos 20 anos com um rigor e precisão científica sem precedentes (mesmo no caso de Buillane de Lacoste, sempre preso à grafologia). André Guyaux, Steve Murphy e outros realizaram enormes progressos na edição crítica de textos ("Iluminações", no caso do primeiro, "Poesias", para o segundo, textos integrados, em ambos os casos, às obras completas do poeta). Abordar Rimbaud de maneira não erudita não só é possível como desejável, diria até que prioritário. Os textos dele não são um alfarrábio. O admirador de sua poesia não precisa ser maníaco. Por isso o interesse na leitura por estudantes, atores e leitores de boa-fé.

Pergunta - Em que Rimbaud pertence a seu século e em que ele transcende sua época?
Brunel -
O Rimbaud de começo de carreira é inseparável de sua época porque ele reagia aos acontecimentos (a queda do imperador, a Comuna de Paris). O Rimbaud tardio também atende a essa descrição. Mas a palavra-chave em sua obra e vida veio a ser o "distanciamento onírico" (do poema "Génie" [Gênio], em "Iluminações"). É por esse desligamento que ele transcende sua época e exerce sobre nós o brilho de uma indisputável fascinação.


Tradução Paulo Migliacci

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