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Betancourt lança crônica do cativeiro
Obra relata o período que a ex-senadora colombiana passou como refém das Farc na selva colombiana
Sequestrada em 2002,
a então candidata
à Presidência da Colômbia hoje não quer voltar ao seu país
SYLVIA COLOMBO
EDITORA DA ILUSTRADA
No dia 22 de fevereiro de
2002, a então candidata à
Presidência da Colômbia, Ingrid Betancourt, estava no
meio de uma entrevista à Folha, por telefone, quando foi
interrompida por assessores
de campanha.
Teve de cortar o papo, cujo
tema era seu livro "Coração
Enfurecido" (Objetiva), que
acabava de ser lançado no
Brasil. E pediu: "Você pode
me ligar na segunda, e aí
completamos a matéria?".
As coisas, como se sabe,
não saíram como o planejado e Betancourt não pôde
voltar a falar comigo na data
que marcamos. E nem por
muito tempo...
No dia seguinte, foi sequestrada perto de San Vicente del Caguán pelas Farc
(Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia). Ficou
em poder da guerrilha, na
selva, até julho de 2008.
"Sua entrevista ficou marcada na minha agenda com
tantas outras coisas que tinha de fazer. Não larguei esse caderno. Saber que tinha
planos inconclusos me estimulava a continuar", disse,
em nova entrevista, na última terça-feira, por telefone.
O assunto, desta vez, era
seu livro mais recente, "Não
Há Silêncio que Não Termine" -título que poderia também ilustrar esse curioso e
um tanto trágico episódio.
Lançado ao mesmo tempo
em sete idiomas, a obra relata o drama do cativeiro, as
tentativas de fuga e as relações entre ela e outros prisioneiros e guerrilheiros.
Trata-se de um relato pessoal, em que sentimentos
predominam e a política está
no subtexto da narrativa.
"Há uma tomada de posição, sim. Tento expor o tempo todo o contraste entre o
que eu acreditava que eram
as Farc e o que eu descobri
que elas realmente são", diz.
Para Betancourt, 48, a
guerrilha opera numa estrutura "stalinista" de delação e
desconfiança. Conta que, logo que libertada, assistiu ao
filme alemão "A Vida dos
Outros" [sobre espião que investiga a vida de casal de artistas] e que imediatamente
identificou os paralelos com
o comportamento das Farc.
"Há um prazer em observar os outros para reportar,
para entregar. Entendo que
vigiassem os prisioneiros
com atenção, mas que se vigiassem a si próprios, para
que não desertassem, para
que não ficassem próximos
demais dos prisioneiros, me
assustou muito."
Hoje dividindo seu tempo
entre as casas dos filhos, Mélanie, 25, em Nova York, e
Lorenzo, 22, em Paris, Betancourt diz que a política não é
mais prioridade. Tanto que
não faz críticas ao atual governo -de Juan Manuel Santos, sucessor de Álvaro Uribe, contra quem competia
em 2002. "O Exército faz hoje
o melhor trabalho possível
para conter as Farc".
Para ela, porém, a questão
do narcotráfico já não é um
problema apenas político ou
militar, mas cultural.
"O povo colombiano acostumou-se com o sangue derramado, a morte e a violência. Hoje tem o coração endurecido e, com essa indiferença, não se pode exterminar o problema. É preciso
que haja uma mudança de
coração naquele país." Para
o qual, pelo menos por ora,
ela não pensa em voltar.
NÃO HÁ SILÊNCIO
QUE NÃO TERMINE
AUTOR Ingrid Betancourt
TRADUÇÃO Antonio Carlos Viana,
Dorothée de Bruchard,
José Rubens Siqueira
e Rosa Freire D'Aguiar
LANÇAMENTO Companhia das
Letras
PREÇO R$ 45 (553 págs.)
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