São Paulo, sexta, 25 de setembro de 1998

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Bacon volta para escandalizar


Filme sobre pintor irlandês (1909-1992), que tem sala na Bienal, estréia em Londres envolto em polêmicas e é exibido hoje na MostraRio


CELSO FIORAVANTE
da Reportagem Local

Um filme sobre o pintor irlandês Francis Bacon (1909-1992) que não mostra nenhum de seus quadros. Também não cita nenhuma passagem de seu livro de entrevistas para David Sylvester, seu amigo e maior especialista em sua obra.
Essas são apenas duas das peculiaridades que marcam "Love is the Devil", filme de John Maybury sobre o relacionamento entre o pintor e seu amante George Dyer, que acaba de estrear na Inglaterra e a MostraRio exibe hoje, à 0h.
Os dois mantiveram um relacionamento sadomasoquista que começou com uma tentativa frustrada de assalto, em 1964, e terminou com o suicídio de Dyer, em 1971, em Paris, na véspera da abertura de uma retrospectiva de Bacon no museu Grand Palais.
O Estado britânico também interveio no filme, já que financiou-o parcialmente. Proibiu, por exemplo, que Muriel Belcher, proprietária do pub Colony Room, interpretada por Tilda Swinton, se dirigisse aos clientes com seu bordão "Hello, cunty!" (algo um pouco mais pesado que "Oi, gostosa!").
A relação entre Dyer e Bacon foi tão intensa quanto irregular. Sadomasoquista, Bacon financiava todos os prazeres de Dyer, que se tornava violento com frequência.
Em uma ocasião, Bacon expulsou-o de casa e Dyer denunciou-o à polícia por porte de maconha. Preso, disse: "Quando bebe, ele acha que eu não pago o bastante para ele. Algumas vezes, ele arrombou minha porta e invadiu meu apartamento. Dou-lhe uma mesada regularmente, mas ele vem e pede mais. Às vezes eu dou mais, outras vezes não".
Dyer foi um dos mais constantes modelos de Bacon, que o retratou inclusive como suicida, desfazendo-se sentado no banheiro.
A sala do pintor na 24ª Bienal de São Paulo, uma das mais aguardadas do evento, traz dois trípticos e 12 telas, duas das quais retratando o casal (veja fotos nesta página). Sua curadora, Dawn Ades, chega hoje ao Brasil e realiza palestras, nos dias 28 e 29, na Chácara do Céu, no Rio.
Bacon destacou-se no cenário artístico contemporâneo ao optar por um figurativismo absolutamente particular em um momento (a partir de 1944) em que todas as atenções estavam voltadas para a arte abstrata, consequência da atuação de Jackson Pollock e da hegemonia econômica norte-americana no pós-Guerra.
Com suas cores vibrantes e figuras disformes, que parecem se dissolver na tela, Bacon faz um retrato da condição humana em sua mais alta carga dramática.
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